• Absorção de corpos estranhos durante a consulta de odontologia: deglutição, aspiração, líquidos e sólidos. Má-fé e simulação de deglutição. Literatura de apoio. Fórceps de Magill.


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    ANDRÉ EDUARDO AMARAL RIBEIRO[1], cirurgião-dentista

    RESUMO

    Numa revisão de processos que conduzi como perito e alguns mais interessantes, em outras cidades, notei que existiu um punhado deles querendo indenizações sobre possíveis incorporações de instrumentos: alguns deles são líquidos – o mais frequente foram as soluções cloradas usadas na Endodontia.

    Outros foram instrumentos pequenos, como limas endodônticas e escovas de Robinson. Não vi nenhum caso que o instrumento tenha caído na laringe e descido para a traqueia. Mas vi um caso curiosos: um idoso numa UPA (unidade de pronto atendimento) acreditou que engoliu algum instrumento.  Os exames de imagem do tórax e abdômen recusaram a ideia e nada localizaram. O homem tentou ingressar com uma ação indenizatória, bastante choroso e exagerada. Perdeu no fim e virou motivo de riso. Esteve em dois serviços que não conseguiram localizar nenhum corpo estranho.

    Dois livros muito bons sobre o tema de segurança são MALAMED[2], Emergências Médicas no Consultório e HUPP[3], Cirurgia Oral e Bucomaxilofacial. Sugiro consultar essas duas obras e conhecer o problema, que embora raro, pode nos trazer dor de cabeça na prática odontológica cotidiana, com muitos espertinhos.

    REVISÃO TEÓRICA

    O perigo está na absorção na via aérea, o autor cita mortes por alimentos, finalizadas por paradas cardiorrespiratórias, muito mais comuns em crianças. Em bebês e crianças, as taxas de sobrevivência após uma parada cardiorrespiratória são baixas (2 a 17%) e muitos dos que sobrevivem sofrem sequelas cerebrais sérias e permanentes. Portanto, interessa muitos aos Odontopediatras.

    Epidemiologia[4]:

    A epidemiologia de obstrução de vias aéreas, faringe e esôfago atinge seus picos com os extremos de idade. O Conselho Nacional de Segurança norte-americano reportou que 4.600 indivíduos nos Estados Unidos morreram por causa de obstrução aguda das vias aéreas em 2009. Mais de 90% das mortes causadas por aspiração de objetos por indivíduos em idade

    pediátrica ocorrem em crianças com menos de 5 anos de idade; 65% destas mortes ocorrem em bebês com menos de 1 ano. Os itens comumente aspirados são pedaços de cachorros-quentes, balas arredondadas, castanhas, passas, moedas, brinquedos, bem como outros objetos duros e coloridos. A aspirina infantil, cujo diâmetro é de 7,5 mm, já causou obstrução das vias aéreas e subsequente morte em diversas crianças pequenas. (O diâmetro da abertura da glote tem cerca de 6,5 mm em uma criança de 2 anos de idade. Os pacientes idosos, especialmente aqueles portadores de distúrbios neurológicos e reflexo de vômito deficiente devido ao uso de álcool, convulsões, acidente vascular encefálico, parkinsonismo, trauma e demência senil, também estão sob sérios riscos de aspiração. Vários tipos de objetos, comida e conteúdo estomacal podem ser aspirados. Uma terceira categoria de indivíduos sob risco são aqueles submetidos a procedimentos de sedação, particularmente

    procedimentos odontológicos ou intubação de emergência. Após a avaliação de vários estudos clínicos, a American Heart Association publicou, em 2010, algumas recomendações

    técnicas para o manejo da obstrução das vias aéreas em bebês, crianças e adultos. Este capítulo apresenta tais recomendações. Na maioria dos casos de corpos estranhos causando obstrução das vias aéreas, eles se encontram localizados exatamente nas vias aéreas em lugares onde não se consegue nem ver nem sentir o objeto com a boca sem o uso de equipamentos especiais, como um laringoscópio ou um fórceps de intubação de Magill (itens que não são comumente encontrados nos consultórios odontológicos). O cirurgião-dentista deve ser capaz de reconhecer o problema instantaneamente e agir rapidamente na tentativa de remover o objeto que esteja obstruindo as vias aéreas do paciente. A obstrução aguda das vias aéreas é a principal causa de parada cardiorrespiratória não traumática em bebês e crianças. Em bebês e crianças, as taxas de sobrevivência após uma parada cardiorrespiratória são baixas (2 a 17%) e muitos dos que sobrevivem sofrem sequelas cerebrais sérias e permanentes.

    PREVENÇÃO – Mesmo com todos os cuidados preventivos, pequenos objetos como inlays, onlays, brocas ou restos de material podem cair na orofaringe do paciente e, consequentemente, ser aspirados ou deglutidos. Com a introdução da odontologia de posição

    sentada, na qual o paciente é colocado em uma posição semissupina durante o tratamento, este tipo de incidente tem aumentado. Quando objetos são deglutidos, geralmente penetram no trato gastrintestinal. Durante o ato da deglutição, a epiglote fecha a entrada da traqueia de forma que líquidos ou sólidos não penetrem na traqueia. O esôfago é o sítio mais comum do trato gastrintestinal onde objetos se tornam impactados por causa de sua natureza – o esôfago é um tubo através do qual líquidos e sólidos descem. Mais de 90% dos objetos estranhos que são deglutidos passam pelo esôfago e vão para o estômago e intestinos através de todo o trato gastrintestinal sem complicações.

    Já ao dentista, a teoria defende que a posição semissupina é mais perigosa, que normalmente os corpos estranhos descem pelo esôfago, que na nasofaringe podem ser aspirados ou deglutidos. Os casos que verfiquei em processos indenizatórios foram no Estado de São Paulo, foram dezesseis processos muito semelhantes, sem nenhum aspiração de corpo estranho. E por sorte: O esôfago é o sítio mais comum do trato gastrintestinal onde objetos se tornam impactados por causa de sua natureza – o esôfago é um tubo através do qual líquidos e sólidos descem. Mais de 90% dos objetos estranhos que são deglutidos passam pelo esôfago e vão para o estômago e intestinos através de todo o trato gastrintestinal sem complicações, conforme a obra de Malamed.

    São nossas defesas na cadeira odontológica: Instrumentos e técnicas utilizados para prevenir aspiração e deglutição de objetos: Dique de borracha; Anteparo com gaze (gaze 4 × 4); Posição da cadeira; Assistente dentária; Sucção; Fórceps de intubação de Magill; Ligadura (fio dental).

    Dique de borracha deve ser o melhor deles. O tampão de gaze na garganta costumei a usar muito quando fazia Aprimoramento em Cirurgia Bucomaxilofacial no Hospital do Servidor Público Estadual, no bairro do Ibirapuera. De fato, era uma segurança simples que nunca mais usei depois daquela época – portanto, voltarei a usá-lo nesta segunda-feira.

    A posição da cadeira é evidente: cadeira levantada é mais segura que cadeira deitada, então, trabalhar em dentes inferiores permite inferir que é mais seguro quando se compara aos dentes superiores e a posição supina da cadeira. Quanto ao aspirador de saliva, talvez tenha sido o mais comum e prática, especialmente durantes as exodontias. Ao lado de um assistente atento, poderemos reduzir nosso risco e agir com velocidade.

    Ligadura de fio dental, entendo ser a amarração do bloco de mordida ou outros equipamentos, em especial crianças, para evitar a deglutição. Pessoalmente, nunca passei por esse risco que me lembre nos últimos vinte a quatro anos de Odontologia.

    Quanto ao fórceps de Magill, não faço ideia do que seja, abaixo uma foto dele. Não parece ser impossível tê-lo no consultório.

    O fórceps com 15 cm custa R$ 94,00 numa rápida pesquisa na internet. Acho um bom investimento, especialmente num processo que chegar para nos extorquir. Se alegarmos e comprovarmos que temos o fórceps de Magill, teremos um bom argumento que estávamos equipados e que poderíamos tentar alcançar o instrumento. No entanto, o tampão de orofaringe parece ser bastante prático e simples de uso.

    E outro instrumento que entendi ser o tal fórceps de língua que a literatura fala abaixo:

    Chamado de fórceps Taylor-Boyle, que irei pesquisar.

    Na literatura[5], capítulo 11:

    Entretanto, as complicações estão associadas a objetos tanto deglutidos como aspirados. Objetos deglutidos que entram no trato gastrintestinal podem produzir obstruções ao longo deste trato, abscesso peritonial, perfuração e peritonite. Os objetos que são aspirados tanto para o brônquio principal direito como para o esquerdo podem produzir infecção, abscesso pulmonar, pneumonia e atelectasia. Quando aspirados para dentro da traqueia, essa condição pode levar à morte. Durante uma discussão sobre prevenção de aspiração, Barkmeier et al. ressaltaram a importância de duas principais medidas preventivas – o dique de borracha e o anteparo com gaze. Tais medidas minimizam significativamente a ocorrência de deglutição de corpos estranhos. Outras medidas preventivas são posicionamento do paciente, presença da assistente do dentista, sucção, fórceps deintubação de Magill e uso de ligadura.

    Dique de borracha:

    O dique de borracha isola efetivamente o campo de operação da cavidade oral ou das vias aéreas, prevenindo a deglutição de objetos estranhos. O uso do dique de borracha é recomendado em todos os procedimentos possíveis. Infelizmente, o uso do dique de borracha, em vários tipos de procedimentos odontológicos, tais como tratamento periodontal e cirurgia, não é possível.

    Anteparo com gaze

    Uma cortina na faringe criada com a inserção de uma gaze 4x 3x 4 inserida na parte posterior da cavidade oral previne efetivamente a entrada de partículas pequenas ou líquidos nas vias aéreas. Este anteparo com gaze é particularmente utilizado em pacientes sedados (sedação oral, intranasal ou endovenosa) ou que estejam recebendo anestesia geral, nos quais os reflexos de proteção das vias aéreas se encontram comprometidos. O paciente não sedado geralmente não tolera o anteparo com gaze, uma vez que ele interfere na deglutição ou restringe o volume de ar que poderia ser inspirado através da boca. Esse tipo de anteparo para proteção das vias aéreas não deve ser feito com gaze 2 x3 x2, uma vez que esse tamanho de gaze é muito pequeno e pode ser deslocado facilmente, sendo, portanto, também facilmente aspirado.

    Posição da cadeira

    A posição supina, a qual é recomendada com o objetivo de prevenir a síncope, se torna prejudicial para um paciente que precise utilizar o corpo da língua para segurar contra o palato um objeto que “cai” em direção à orofaringe. A gravidade atua forçando este objeto posteriormente em direção à faringe. Se não existirem equipamentos facilmente disponíveis ao lado da cadeira para remover o objeto, o paciente deve ser posicionado de lado com a cabeça mais para baixo que o tronco e com a parte superior do corpo pendendo para o lado da cadeira (Trendelenburg[6]) .Esta posição utiliza a gravidade a favor do paciente, permitindo que o objeto caia da sua boca.

    Assistente odontológica e sucção

    Na maioria dos consultórios odontológicos, a assistente fica sentada do lado oposto ao dentista. Quando um objeto cai dentro da boca do paciente e existe o risco de o mesmo ser deglutido, a assistente pode ter disponível um ou mais instrumentos que podem ser utilizados na remoção do objeto, tais como as pinças clínicas ou as hemostáticas. Se não houver nada disponível para este fim, um dispositivo de sucção de alta potência com uma ponta de largo diâmetro pode ser utilizado para remover o objeto da boca do paciente. Os sugadores de saliva nem sempre são úteis para este objetivo, uma vez que a força de sucção pode não ser suficiente para remover o corpo estranho. Quando disponível, um fórceps de intubação de Magill permite que a assistente remova o objeto da parte posterior da cavidade oral com mais facilidade.

    Fórceps de intubação de Magill

    O fórceps de intubação de Magill, o qual deve ser incluído no kit básico de emergências do consultório, é designado para permitir a remoção de objetos pequenos e grandes da parte distal da cavidade oral e da faringe. Sua curvatura angulada permite um posicionamento mais confortável na mão, enquanto sua ponta romba permite a boa apreensão do objeto. Nenhum outro instrumento, incluindo a pinça clínica (de algodão) e a pinça hemostática, são designados para este fim.

    Fórceps de língua

    O fórceps designado para segurar a língua tem serrilhados que permitem que a língua seja agarrada firmemente e puxada para fora da boca sem causar lesão iatrogênica. Taylor-Boyle, abaixador de língua.

    Ligadura

    O uso de ligadura (fio dental) pode ajudar na prevenção da aspiração ou deglutição de objetos utilizados na odontologia e na remoção deles da parte mais distal da cavidade oral e da faringe. Alguns dos objetos que devem ser presos ao fiodental são grampos de isolamento, instrumentos endodônticos, rolos de algodão, chumaços de gaze, assim como todos os outros pequenos objetos colocados na cavidade oral durante o tratamento odontológico. A presença do fio dental diminui a probabilidade de que o paciente possa engolir um objeto ou que inadvertidamente deixe o consultório com um rolinho de algodão esquecido na boca.

    Se a assistente estiver presente

    Colocar o paciente em posição supina ou posição de Trendelenburg

    Utilizar fórceps de intubação de Magill ou aparelho de sucção para remover o corpo estranho

    Se a assistente NÃO estiver presente

    Instruir o paciente para deitar sobre o braço da cadeira com a cabeça para baixo

    Encorajar o paciente a tossir

     E após o objeto deglutido ou aspirado, o decúbito lateral fica indicado, a tosse não deve ser estimulada, enquanto o paciente espera em nosso consultório. Pela anatomia, o mais provável é que ele esteja no brônquio direito. No serviço médico, a broncoscopia com fibroscopia é normalmente o procedimento usado no caso de aspirações.

    Na literatura[7]:

    Manejo

    Quando um objeto penetrar na orofaringe de um paciente que se encontra deitado em posição supina ou semissupina, não se deve permitir que o paciente se sente. A cadeira odontológica deve ser movimentada para uma posição ainda mais deitada (p. ex., posição de Trendelenburg, se possível) enquanto a assistente remove o objeto com o fórceps de intubação de Magill. A colocação do paciente em Trendelenburg permite que a gravidade ajude a mover o objeto para mais próximo da cavidade oral, tornando-o visível e facilitando sua remoção por meio do fórceps de Magill. Se o objeto não puder ser visualizado (p. ex., o paciente o “engole”), devem ser feitas radiografias de modo que sua localização possa ser determinada; o paciente não deve ser liberado do consultório sem os arranjos para que a radiografia seja feita. Uma vez que os sinais e sintomas clínicos nem sempre indicam se o objeto se encontra no trato gastrintestinal ou no trato respiratório, o cirurgião-dentista deve acompanhar o paciente (se possível) para o serviço hospitalar de emergência ou laboratório de radiologia mais próximo.

    Na maioria dos casos o radiologista recomenda uma radiografia do abdome ou uma visão anteroposterior (AP) ou lateral do tórax. É desejado que o objeto, quando encontrado, seja visto na radiografia abdominal em vez de na torácica, como, por exemplo, dentro de um brônquio. Em qualquer situação na qual o objeto é encontrado dentro do trato gastrintestinal ou do tórax, a assistência médica especializada deve ser requerida – gastroenterologista, pneumologista ou anestesiologista. Os manejos subsequentes serão provavelmente direcionados pelo seu médico particular. Se a localização do objeto não puder ser identificada na radiografia ou se existir qualquer dúvida sobre onde ele está localizado, ou ainda qualquer complicação potencial estiver presente, o médico deve ser consultado imediatamente. Usualmente, os sinais ou sintomas exibidos pelo paciente podem auxiliar a identificar se o objeto penetrou na traqueia. Tais sinais e sintomas incluem início inesperado de tosse, engasgo, chiado e dificuldade respiratória. Mais de 90% dos pacientes que aspiram objetos exibem tais sinais e sintomas uma hora após a aspiração. Alguns poucos pacientes experimentam um intervalo de tempo de até seis horas antes que os sintomas se tornem evidentes. Dependendo da gravidade da ocorrência, pode ocorrer apneia imediatamente em até um terço destes pacientes. Os sintomas podem progredir para cianose e outros sinais sérios de hipoxemia.

    Em situações nas quais o objeto presumivelmente penetrou na traqueia, um protocolo bem definido deve ser seguido, a começar por assegurar que o paciente não se sentará (sentar verticalmente pode impulsionar o objeto ainda mais profundamente na traqueia ou brônquio). O paciente deve ser posicionado em decúbito lateral esquerdo com a cabeça mais baixa que o corpo. O paciente pode tossir espontaneamente; se não, a tosse deve ser encorajada na tentativa de expelir o objeto. O reflexo natural de tosse é poderoso e em muitos casos auxilia o paciente a adequadamente expelir o objeto aspirado. Se o paciente parar de tossir e relatar que o objeto foi deglutido, ainda assim ele não deve ser liberado do consultório até que seja encaminhado para o médico ou radiologista para se certificar de que o corpo estranho não está localizado na região traqueobronquial. Apenas se o objeto foi expelido ou removido, o paciente poderá ser liberado do consultório. Além disso, antes de o paciente deixar o consultório, uma consulta médica deve ser feita com um especialista (p. ex., pneumologista) a fim de discutir a prevenção, o reconhecimento e o controle das complicações pós-aspiração. Se o objeto não foi removido, o cirurgião-dentista deve acompanhar o paciente ao serviço de emergência para diagnóstico definitivo e tratamento. Se estiver determinado que o objeto se encontra na região traqueobronquial, o mais provável é que ele esteja no brônquio direito. Quando comparado com o brônquio esquerdo, o brônquio principal direito percorre um caminho mais retilíneo em sua bifurcação com a traqueia. O brônquio principal direito deixa a traqueia em um ângulo de 25 graus enquanto o brônquio principal esquerdo a deixa em 45 graus. A remoção do objeto do brônquio pode envolver o uso de broncoscopia fibróptica para localizar (visualizar) o objeto e de um broncoscópio para removê-lo. Se a broncoscopia não obtiver sucesso (raro), um procedimento cirúrgico conhecido como toracotomia pode ser necessário. Uma emergência potencialmente fatal não está presente nas situações anteriormente descritas. No entanto, o paciente não deve ser liberado do consultório a menos que o objeto tenha sido removido. Um manejo médico adicional será necessário para a prevenção de consequências mais sérias (infecção, pneumonia, broncoespasmo).

    Já em outra obra, HUPP, no segundo capítulo ele menciona as emergências mais comuns no consultório dentário, p. 22:

    Reações de Hipersensibilidade

    Desconforto Torácico

    Dificuldade Respiratória: Asma, Hiperventilação, Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, Aspiração de Corpo Estranho, Aspiração de Conteúdo Gástrico

    Alteração da Consciência: Síncope Vasovagal, Hipotensão Ortostática, Convulsão, Toxicidade ao Anestésico Local, Diabetes Melito, Disfunção Tireoideana, Insuficiência da Supra-renal, Comprometimento Cerebrovascular

    E cita as aspirações[8]:

    Aspiração de Corpo Estranho

    A aspiração de corpos estranhos para as vias aéreas sempre é um problema em potencial durante uma cirurgia oral e outros procedimentos odontológicos. Isto é especialmente verdadeiro se o paciente for colocado em posição supina ou semiereta na cadeira, ou se estiver sedado o sufi ciente para impedir o reflexo do vômito. Os objetos que alcançam a hipofaringe são frequentemente deglutidos e geralmente passam inofensivamente pelo trato gastrointestinal. Mesmo que o dentista esteja seguro de que o material foi deglutido, devem ser realizadas radiografias torácicas e abdominais para eliminar a possibilidade de uma aspiração assintomática para trato respiratório. Ocasionalmente, o objeto estranho é aspirado para a laringe, de onde, em um paciente levemente sedado ou não-sedado, provoca uma tosse violenta que pode expeli-lo. O paciente, de forma geral, ainda pode conversar e respirar. No entanto, objetos maiores, se aspirados, podem obstruir as vias aéreas e permanecerem alojados de tal maneira que a tosse é ineficaz, pois os pulmões não podem ser preenchidos com ar antes da tentativa de tossir. Nesta situação, o paciente, em geral, não produz qualquer vocalização e fica extremamente ansioso. A cianose logo aparece, o que leva à perda da consciência. A maneira pela qual será conduzido o tratamento para um corpo estranho aspirado dependerá primariamente do grau de obstrução das vias aéreas. Deve-se permitir que os pacientes que mantêm o reflexo do vômito intacto e possuem obstrução parcial das vias aéreas tentem expelir o corpo estranho por meio da tosse. Se o material não for expelido, o paciente deve receber oxigênio suplementar e ser transportado para uma unidade de emergência para que uma laringoscopia ou uma broncoscopia seja realizada. No paciente com obstrução completa, mas que permanece acordado, deve ser realizada pressão abdominal ou manobra de Heimlich até que se obtenha sucesso na expulsão do objeto ou haja a perda de consciência do paciente. Se o paciente está com o reflexo do vômito diminuído em decorrência da sedação ou está com as vias aéreas completamente obstruídas e houver perda da consciência, a pressão abdominal deve ser realizada com o paciente em posição supina. Após cada compressão, o paciente deve ser rapidamente colocado de lado e o dentista deve introduzir os dedos na boca do paciente para remover qualquer objeto que tenha sido forçado para fora. Se o paciente não estiver expelindo o ar, deve-se iniciar SBV. Se o ar não puder ser transportado para os pulmões, deve-se tentar fazer maior compressão abdominal, seguida de movimento dos dedos pela boca e SBV. Os dentistas treinados em laringoscopia podem olhar a laringe e usar um fórceps Magill para tentar remover qualquer material estranho. Se as várias tentativas falharam em aliviar a obstrução, pode ser necessária uma cricotirotomia de emergência.

    Aspiração de Conteúdo Gástrico

    A aspiração do conteúdo gástrico para o trato respiratório inferior representa outra situação que frequentemente desencadeia dificuldades respiratórias graves. O material particulado proveniente do conteúdo gástrico causa obstrução física das vias aéreas pulmonares, mas geralmente é a alta acidez do conteúdo gástrico que produz problemas mais sérios. O baixo pH do suco gástrico em contato com o tecido pulmonar provoca necrose rapidamente, o que desencadeia a síndrome da angústia respiratória logo em seguida, com transudação de líquido para os alvéolos pulmonares e perda do funcionamento do tecido pulmonar. O paciente com o reflexo do vômito intacto raramente aspira conteúdo gástrico durante o vômito. Assim, o paciente com reflexo do vômito diminuído por causa da sedação, inconsciente ou com anestésico tópico na orofaringe é quem corre riscos maiores de aspiração gástrica. O paciente sedado ou inconsciente que aspira uma quantidade significativa de material gástrico apresentará, primeiro, sinais de dificuldade respiratória, tais como taquipneia e sibilo. Taquicardia e hipotensão podem ocorrer em seguida, e à medida que a capacidade ventilatória diminui, aparece a cianose. Eventualmente ocorre insuficiência respiratória refratária ao SBV e é necessária a realização de intubação e fornecimento de altas concentrações de oxigênio. A prevenção da aspiração gástrica envolve instruções para o paciente evitar comer ou beber nas 8 horas anteriores a qualquer cirurgia oral agendada durante a qual ele possa estar moderado ou profundamente sedado. O paciente profundamente sedado ou inconsciente que começar a vomitar deve ser imediatamente colocado em uma posição com a cabeça para baixo e pés elevados e o corpo virado para o lado direito, a fim de facilitar a drenagem oral do vômito. A lista vários sintomas exibidos pelos pacientes prestes a vomitar. Um sugador de alta potência deve ser utilizado para a remoção do vômito da cavidade oral. Se o dentista suspeitar de que material gástrico possa ter entrado no trato respiratório inferior, um serviço de emergência deve ser chamado. O paciente deve receber suplementação de oxigênio e ter os sinais vitais monitorados. Se possível, o dentista deve fazer um acesso venoso (i.e., iniciar IV) e estar preparado para administrar solução cristaloide (p. ex., soro fisiológico ou dextrose a 5% em água) para ajudar a tratar a queda da pressão sanguínea e permitir que os técnicos de emergência administrem broncodilatadores, se necessário. O transporte imediato do paciente para uma unidade de emergência é mandatário.

    Acredito ter produzido um bom resumo, com duas fontes e de fácil entendimento.

    São Paulo, 21 de março de 2025

    (assinatura digital)


    [1] Nomeado 299 vezes em perícias cíveis até 20 de março de 2025.

    [2] MALAMED, MEDICAL EMERGENCIES IN THE DENTAL OFFICE, SEVENTH EDITION, by Mosby, 2015.

    [3] MALAMED, MEDICAL EMERGENCIES IN THE DENTAL OFFICE, SEVENTH EDITION, by Mosby, 2015, p.307.

    [4]

    [5] MALAMED, MEDICAL EMERGENCIES IN THE DENTAL OFFICE, SEVENTH EDITION, by Mosby, 2015. Capítulo 15.

    [6] A posição de Trendelenburg é aquela em que o paciente é posicionado com a cabeça mais baixa que o corpo e os pés são elevados em 15 a 30 graus. Recebeu esse nome devido ao cirurgião alemão Friedrich Trendelenburg (1844-1924).

    [7] MALAMED, MEDICAL EMERGENCIES IN THE DENTAL OFFICE, SEVENTH EDITION, by Mosby, 2015. Capítulo 15.

    [8] HUPP, Cirurgia Oral e Bucomaxilofacial, 5ª edição, tradução, St. Louis, 2015. Capítulo 2.

  • SUBSTITUIÇÃO DE PROVAS. PROVAS NATURAIS NA ODONTOLOGIA, PROVAS ARTIFICIAS DO MAU ADVOGADO. QUALQUER TIPO DE PROVA VALE? QUALIDADE DAS PROVAS. PROCESSOS DA FUNILARIA

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    Por André Eduardo Amaral Ribeiro, cirurgião-dentista e perito na área da Odontologia.

    1. Provas naturais na Odontologia forense

    Os processos cíveis somam aqueles pedidos de indenização, reembolso ou resolução de contrato. Os objetos de indenização podem ser tecidos lesionados: duros (dentes e ossos) ou tecidos moles (lábios, pele, mucosa, língua, olhos feridos).

    Numa regra, os tecidos moles devem ser documentados por fotografias e os tecidos duros por radiografias e tomografias. Logo, não se pode inverter a lógica. Não se pode mostrar uma mancha na mucosa jugal com uma radiografia, do mesmo modo que nunca se apresentará uma fotografia para avaliar a qualidade do selamento dos canais radiculares.

    Num caso concreto de indenização, a pessoa ofendida alegava que sua pele foi queimada por um produto líquido usado durante o tratamento endodôntico, lembrou o cheio de cloro de piscina disse que sua pele e seu olho esquerdo foram queimados, comprovou com fotografias. Agiu com lógica, pois pretendia a avaliação de seus tecidos moles. A prova natural seria a fotografia, a prova antinatural seria, por exemplo, uma radiografia panorâmica da face.

    Outro tipo de prova serão as provas de papel, digitalizadas ou arquivos de computador. Para provar um pagamento, a pessoa apresenta um recibo ou um comprovante bancário digital. Tentar usar uma prova por outra não adianta. Uma radiografia não poderia vir no lugar de um recibo bancário.

    Para elencar as provas naturais nos processos cíveis que versem em Odontologia:

    Contratos e pagamentos: recibos, comprovantes bancários, pix, planejamentos, orçamentos (carimbados e datados);

    Endodontia: radiografias periapicais e panorâmicas. Talvez a Endodontia seja a especialidade em as radiografias são as únicas provas possíveis.

    Periodontia: prontuário com medidas das bolsas, radiografias periapicais completas, fotos de cirurgias periodontais.

    Cirurgia: radiografias para dentes, fotografias para tecidos moles.

    Ortodontia: CAD/CAM direto ou indireto, Cefalometria, fotografias padronizadas antes do tratamento e na sua conclusão, prontuário bem detalhado, com carimbo profissional e rubrica do paciente.

    Dentística: CAD/CAM direto ou indireto, moldes de gesso, radiografias de diagnóstico, radiografias pós-reabilitação, moldagens digitais. As facetas em si podem ser apresentadas ao perito

    Próteses: CAD/CAM direto ou indireto, moldes de gesso, radiografias de diagnóstico, radiografias pós-reabilitação, moldagens digitais. As próteses em si podem ser apresentadas ao perito.

    Lentes de contato e procedimentos estéticos: fotografias pré e pós-reabilitação padronizadas.

    Harmonização facial e procedimentos estéticos: talvez as fotografias sejam as provas naturais e absolutas. Uma radiografia poderá revelar a região mentoniana, mas a prova natural é a fotografia, e sempre datada.

    Um detalhe é a datação das fotografias, fácil de se obter com ajuste de configuração do celular. Outro tipo de prova frequente são as conversas de WhatsApp. A dentista tenta provar que entregou dez lentes de contato, ao invés de nove delas, mas por meio da interpretação de uma conversa de texto, cheia de emoticons, símbolos de arquivo de áudio. A prova natural seria a fotografia comparativa, os dez dentes afirmados e as dez lentes cimentadas. É muito difícil inverter essa lógica. As provas nos processos cíveis há tempos foram acrescentadas do chamado CAD-direto (partir da digitalização direta da boca) ou indiretos (aqueles produzidos em laboratório).

    Na literatura[1]:

    O CAD DIRETO OU CAD DE CONSULTÓRIO OU CAD INTRAORAL – para muitos cirurgiões-dentistas, pois para muitos pacientes é considerado incômodo e pode causar mal-estar e náuseas. Mesmo os pacientes que suportam bem tal procedimento dificilmente o considerarão agradável. Esse procedimento clínico era, até bem pouco tempo, essencial para análises de modelos de estudo e planejamento de casos clínicos, bem como para a execução de procedimentos protéticos odontológicos sobre mucosa, dentes e implantes. Na verdade, em certas situações ainda o é, mas a novidade é que para determinados tipos de próteses já se pode eliminar por completo a necessidade da moldagem convencional, com moldeiras e materiais de moldagens, ora à base de hidrocoloides, ora à base de borrachas, entre outros

    Em verdade, a obtenção de modelos virtuais a partir da digitalização direta da boca (daí o título do capítulo, CAD direto), já existe comercialmente desde meados dos anos 1980, por meio do sistema CEREC, com mais de 27.000 unidades instaladas em consultórios de mais de 50 países e mais de 20 milhões de restaurações feitas nesse período.1 A real novidade é sua alta qualidade, possibilitando imagens com riqueza de detalhes que podem deixar orgulhoso ou frustrado o autor do preparo protético, a depender da sua competência. Atualmente, vários sistemas CAD que possibilitam a digitalização direta da boca estão disponíveis comercialmente. Diferem entre si em vários aspectos, sendo os mais perceptíveis:

    (1).A técnica de digitalização das imagens reais ou “escaneamento” da boca: câmeras potentes que usam diferentes técnicas para capturar as imagens e geram diferentes arquivos para trabalhar nos diversos softwares de CADs.(2) As possibilidades de trabalho à disposição pelo software, ou seja, o que é possível executar: se apenas a obtenção do modelo; se desenham só estruturas e de até quantos elementos; se desenham coroas: parciais e totais, anteriores e posteriores e se fazem tanto coroas quanto estruturas; se desenham mais de uma coroa ao mesmo tempo; se personalizam pilares sobre implantes e se desenham próteses implantadas aparafusadas. (3) As possibilidades de interação com equipamentos de CAM, ou seja, com as máquinas que usinarão a peça desenhada. Alguns sistemas são fechados e vendem o equipamento de captura e desenho acompanhado da fresadora; outros vendem apenas o equipamento de captura e desenho, e outros apenas o equipamento de captura – neste último caso, o CAD propriamente dito seria utilizado em uma central de desenho.

    E o conceito de CAD indireto na mesma obra[2]:

    Este capítulo e o próximo abordam as unidades CAD e serão divididos entre CAD indireto ou de laboratório, tratado neste capítulo, e CAD direto, de consultório ou intraoral.Esses capítulos mencionarão formas de escaneamento para captura das imagens em diferentes situações clínicas a partir do escaneamento dos modelos de gesso e registros, tradicionalmente obtidos (indireto) ou diretamente do escaneamento da boca (escâneres intraorais). A expressão “situações clínicas” refere-se ao arco de trabalho – antagonista e seu relacionamento intermaxilar e tradicionalmente obtido –, aos procedimentos técnicos, normalmente utilizados: 1. Sobre dentes: por meio de moldagem convencional, ou seja, com moldeiras de estoque e materiais de moldagem a base de borracha (siliconas, mercaptanas ou poliéteres) após afastamento gengival, traumático (fio ou bisturi elétrico) ou atraumático (casquetes de moldagem). 2. Sobre implantes: com componentes específicos para moldagem (transferentes) e réplicas de pilares ou implantes com moldeiras abertas ou fechadas e os mesmos materiais descritos. Bons trabalhos protéticos são obtidos há décadas em laboratórios de prótese após os cirurgiões-dentistas fornecerem boas referências aos procedimentos laboratoriais. As mencionadas referências são: modelos normalmente a base de gesso (obtidos a partir de boas moldagens) e registros, o que permite uma correta montagem em articulador, favorecendo a resolução protética laboratorial da situação clínica em questão, seja sobre dentes, seja sobre implantes. Após essas etapas, os procedimentos laboratoriais podem ser realizados com mínimas distorções em relação à boca. As inovações tecnológicas promovem a otimização das técnicas desenvolvidas em laboratório e o CAD indireto (de laboratório) é a inovação que será tratada neste capítulo. Podendo acelerar procedimentos quando da obtenção de enceramento ou até realizando procedimentos no CAD, Estruturas ou mesmo Próteses, evitando procedimentos laboratoriais como enceramento, inclusão, fundição e aplicação de porcelana. Após a digitalização dos modelos e o desenho da restauração, o próximo passo será o envio desses dados a uma central de CAM ou a uma máquina do laboratório. O capítulo cinco mostrará a revolução do sistema CAD no consultório (também chamado de CAD direto ou intraoral), a partir de moldagens digitais em substituição às moldagens convencionais, que poderão ser encaminhadas por e-mail a um laboratório, a uma central de usinagem ou a uma máquina de CAM presente no próprio consultório, daí a necessidade didática da separação dos dois capítulos. O CAD (Computer Aided Design) propriamente dito atua após a captura da imagem pelo escâner e trata-se de um software instalado em um potente computador, que pode já vir de fábrica acoplado ao escâner ou montados (normalmente por entrada USB) após a aquisição. São inúmeros os programas de CAD voltados a odontologia restauradora, e seria praticamente impossível abordarmos todos eles, não sendo esta a finalidade deste capítulo, e sim abordar alguns sistemas, permitindo um entendimento por parte do leitor do que é possível ser feito até porque existe uma tendência de boas ferramentas digitais serem “copiadas” em novas versões dos diferentes softwares. Esses softwares, utilizados após o escaneamento que possibilita gerar o modelo digital, permitem delimitar término cervical e o recorte do troquel, individualizando a área de trabalho laboratorial. Há também os softwares que possibilitam o desenho de uma estrutura para próteses cimentadas, alguns permitem a escolha de pilares para implantes e desenho de estruturas para próteses aparafusadas,2 já outros desenham coroas parciais e totais, tanto para dentes anteriores, quanto posteriores. O desenho das coroas é obtido a partir de uma base de dados de uma biblioteca preexistente ou por meio da personalização da coroa a ser criada de acordo com a anatomia de dentes adjacentes. A maioria deles ainda disponibiliza ferramentas digitais, para que o operador possa modificar a peça sugerida pelo software, personalizando ou melhorando o trabalho gerado. Nem todos os softwares disponibilizam todas essas diversidades de tarefas, mas todos executam o planejamento em poucos minutos, restando apenas enviar o arquivo gerado para uma máquina de CAM, que executará os comandos contidos no referido arquivo, confeccionando uma peça real, conforme o programado, a partir de placas ou blocos prontos, por tecnologia de desgaste ou pela tecnologia de sobreposição, camada por camada, sendo também rapidamente confeccionadas, o que gera o maior impacto e benefício do processo: a rapidez

    Na literatura[3] de língua inglesa, sobre exame de tecidos duros e tecidos moles:

    Exame clínico

    Um exame clínico completo usando modelos de estudo e uma avaliação geral do paciente são essenciais, pois uma boa seleção de casos é fundamental para o sucesso a longo prazo dos implantes. Uma abordagem multidisciplinar envolvendo cirurgiões, protesistas e técnicos em prótese dentária é frequentemente adotada devido aos muitos fatores importantes que precisam ser considerados, incluindo:

    ● A idade, saúde geral e motivação do paciente

    ● A condição e posição dos dentes remanescentes (se presentes), incluindo sua oclusão

    ● O estado dos tecidos periodontais e o nível de higiene bucal

    ● A condição – qualidade e quantidade – do osso edêntulo mandibular ou alveolar maxilar

    ● A condição dos tecidos moles orais.

    EXAME RADIOGRÁFICO

    Nos últimos anos, várias diretrizes foram publicadas nos EUA e na Europa, recomendando o(s) exame(s) radiográfico(s) mais adequado(s) para uso no planejamento do tratamento pré-operatório. No entanto, as evidências confiáveis nas quais basear as recomendações ainda são limitadas. Além disso, outras variáveis contribuem para a discordância dos critérios de seleção em situações clínicas individuais. Exemplos disso incluem:

    ● A experiência do operador

    ● A minuciosidade do exame clínico, incluindo o uso de técnicas de mapeamento de cristas

    ● O local anatômico proposto.

    Há uma série de investigações que são adequadas em diferentes situações clínicas. A escolha clínica pode depender da disponibilidade de instalações. As investigações incluem: Radiografia periapical

    ● Radiografia panorâmica

    ● Radiografia oclusal inferior de 90°

    ● Radiografia cefalométrica lateral

    ● Programas de tomografia linear transversaldisponíveis com algumas máquinas panorâmicas modernas

    ● TC de feixe cônico. Isso é ideal para avaliação de implantes e provavelmente se tornará a modalidade de imagem de escolha quando for necessária uma imagem transversal. A manipulação computacional permite a produção de imagens panorâmicas e transversais (transaxiais). Os dados da TCFC podem ser importados para programas de software de planeamento de implantes especialmente concebidos, como o SimPlant® ou o NobelGuide®, para criar reconstruções 3D dos maxilares e planear a colocação de implantes em três dimensões. O software também pode ser usado para projetar um guia de perfuração para que os acessórios do implante possam ser colocados com precisão nos locais propostos.

    ● Tomografia computadorizada (TC). Programas de computador odontológicos específicos, projetados para planejamento de implantes, foram escritos e compatíveis com a TC médica. Isso geralmente envolve cerca de 30 varreduras axiais por mandíbula, cada uma com 1,5 mm de espessura. Essas informações podem então ser manipuladas por computador para produzir imagens reconstruídas transversais, panorâmicas e tridimensionais reformatadas. Os dados da TC também podem ser importados para o software de planejamento de implantes.

    ● Ressonância magnética (RM). Isso oferece as vantagens de não usar radiação ionizante e produzir seções em qualquer plano desejado sem reformatar.

    II- Substituição das provas naturais por provas criadas ou artificiais

    Advogados inexperientes, sem recursos para contratar assistentes técnicos tentam criar conjuntos de provas ineficazes para suprir os custos da obtenção das provas de qualidade na avaliação odontológica: as provas naturais. Costume me referir a  “processos de funilaria”. Quando se amassa a lataria do carro em uma pequena colisão,  mas nenhum dos dois motoristas têm um seguro, as pessoas costumam combinar que o que receberá o conserto deverá fazer três cotações em funileiros. Então, envia esses três orçamentos para o motorista que assumiu o pagamento.

    Pode não parecer, mas existe muita relação com que encontro nas minhas nomeações periciais. O advogado sem noção pede a seu cliente para sair pelas ruas, encontrar e incomodar três dentistas, com a suposta história de quer tratar seus dentes, reabilitar suas perdas e colocar implantes sobre rebordos desfavoráveis. Cada um dos orçamentos apresenta um tratamento totalmente diferente: um misturou próteses removíveis com uma prótese fixa, o segundo pensou em reabilitar com uma prótese total no arco superior e uma prótese implantossuportada; já o terceiro dentista teve uma outra proposta: dois protocolos. Até hoje não descobri se o próprio advogado acredita na petição que escreveu. Realmente não sei.

    A segunda prova artificial será uma longa e incompreensível conversa, por dois meses no WhatsApp. O paciente brigando com a atendente da clínica por escrito. Pede o dinheiro de volta, depois muda de ideia e volta ao consultório para uma cimentação. Dois dias se passam e ele resolve ir ao Procon, que aceita a reclamação e envia a carta para a audiência de conciliação. Mas o paciente ouviu de alguém que a Justiça é melhor porque ganhará um troco (que entendo ser o dano moral). Então, o paciente muda de ideia e vai procurar um advogado do bairro, que propõe a ideia do processo de funilaria.

    Alguns advogados lembram que o prontuário existe. E resolve pedi-lo ao dentista, ou melhor, para que o cliente vá ao dentista e peça para olhar o prontuário. O problema da cópia foi enorme no passado, quando o paciente precisava sair para xerocar (copiar) os documentos numa papelaria do bairro. Com as câmeras de telefone celular, esse problema acabou. Em dois minutos, o interessado pode fotografar seu prontuário inteiro sob vigilância da recepcionista do dentista. Então, não existe mais nenhuma desculpa para não apresentar o prontuário nos autos do processo.

    O prontuário original não é obrigatório. As fotografias comuns servem como prova e tente datá-las com as configurações do seu telefone.

    Pronto, temos um processo fabricado com as provas erradas, com poucas chances de sucesso, um paciente com uma cabeça sonhadora e um advogado perdido. E às vezes dá certo, mas dá certo porque 64% dos dentistas não escrevem um prontuário mínimo. O significado do prontuário deve ser: escrever o mínimo, de modo que o dentista que continuar o tratamento saiba o foi feito e o que falta fazer. Não é tão difícil. Na minha opinião, o melhor prontuário é aquele feito com uma folha sulfite, uma caneta Bic e um carimbo profissional. Sempre date e carimbe todas as consultas, também pegue a rubrica do paciente quando fizer um procedimento mais extenso ou caro, que tenha a possibilidade de que alguém queira o dinheiro de volta.

    Dica

    A justiça ainda gosta de testemunhas. Um resquício de quando as câmeras de segurança eram raridade. Não faz sentido hoje avaliar um atropelamento de trânsito por meio de depoimentos de testemunhas no fórum. A gravação de vídeo proporcionará tudo isso. E quase todos os consultórios têm suas filmagens. Embora as testemunhas sejam antiguidades, sempre anote o nome de quem o auxiliou nas consultas. Essa pessoa será a testemunha caso haja qualquer tipo de processo. Lembre-se dos processos que vem surgindo aos poucos sobre assédio sexual no consultório ou abusos a crianças. Portanto, coloque uma câmera no seu consultório e não avise ninguém com a placa Sorria,você está sendo filmado. Pense primeiro na sua empresa, nas suas finanças e na sua segurança.

    Num caso de suposto assédio ou agressão, talvez a pessoa que o auxiliou naquela consulta específica será sua rocha de defesa.

    Conversas do WhatsApp

    A prova que mais observo nos processos nos quais fui nomeado são as intermináveis conversas nos aplicativos. Nada ajudam. Na melhor opção, servem para entender quem ficou devendo dinheiro para quem. São artificiais ou substitutas impróprias para as provas clássicas e naturais: prontuário, radiografias, fotografias.

    No entanto, os advogados insistem. Dizem que qualquer coisa serve de prova. Para aquele com um objetivo,


    [1] KAYATT, Fernando. Aplicação dos Sistemas CAD/CAM na odontologia restauradora; Rio de Janeiro, Elsevier, 2013, p. 135.

    [2] KAYATT, Fernando. Aplicação dos Sistemas CAD/CAM na odontologia restauradora; Rio de Janeiro, Elsevier, 2013, p. 73.

    [3] WHAITES, Essentials of Dental Radiography and Radiology, fifth edition, Elsevier, London, 2013, p. 294.

  • FORMAS APELATIVAS DE AÇÃO QUANDO SE PERCEBE QUE A DERROTA É INEVITÁVEL NO PROCESSO DE INDENIZAÇÃO EM ODONTOLOGIA. O FUTURO DAS INDENIZAÇÕES NO PRÓXIMOS TRINTA ANOS. SEGURADORAS NO FUTURO. RESSEGURO.

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    Por André Eduardo Amaral Ribeiro[1], cirurgião-dentista e perito na área da Odontologia.

    COMPORTAMENTOS APELATIVOS DO PERDEDOR

    Os processos cíveis somam aqueles pedidos de indenização, reembolso ou resolução de contrato.

    O processo corre e as argumentações perdem o suporte para quem está mentido, exagerando ou inventando uma mentira, sempre para cavar uma indenização de um dentista. Nessa decadência, a cada movimento processual o mentiroso vai se encolhendo e começa a ter ideias mirabolantes e agressivas.

    Os que estavam te acusando e mudam para se defender, podem começar a atacar às pessoas com ofensas pessoais ou profissionais. Exemplos: é um péssimo dentista, o perito não tem formação suficiente para atuar nesse processo, a faculdade que cursou não presta. Não se intimide.

    Outros modos concretos são ingressar com um boletim de ocorrência na delegacia, abrir uma ação ética no conselho de Odontologia ou até protocolar uma reclamação na Corregedoria Geral de Justiça ou Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Brasília.

    Já enfrentei tudo isso nesses onze anos de atuação pericial. Uma primeira coisa que temos que aprender é o peso e o valor da retratação, ou seja, pedido de desculpas por escrito e público. Vale retratar-se nos autos. Mesmo que contrariado, faça isso sem hesitar. Veja um trecho do código penal que trata de três crimes em alta hoje, em especial nas redes sociais: calúnia, difamação e injúria. Eles são diferentes na teoria, na prática são iguais. No Código Penal:

    Retratação

    Art. 143 – O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena.

    Parágrafo único. Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. (Incluído pela Lei nº 13.188, de 2015).

    Os três crimes podem começar por documento protocolado na delegacia ou no fórum, e será julgado no JECRIM, Juizado Especial Criminal. O importante é conhecer a regra da retratação. Na dúvida, escreva sua retratação o quanto antes. A retratação mesmo que seja contra sua vontade sempre funciona.

    Numa perícia judicial, aquele que está perdendo vai nos intimidar-nos com esses ataques. E contabilize que isso vai acontecer em algum momento da sua carreira. O perito deve comunicar o Juiz de Direito qualquer fraude que perceba, sob pena de falsa perícia. Veja o Código Penal:

    Falso testemunho ou falsa perícia

    Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

    Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)

    § 1 o As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

    § 2 o O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

    Exceto se você for um corporativista. Isso significa peritos que estão no jogo com visão distorcida, acham que estão lá para ajudar colegas dentistas a se isentarem das responsabilidades com os pacientes. E isso não se trata de ética ou Código de Ética, trata-se mentalidade. Não poucos peritos iniciantes entram na profissão com esta noção, defender a classe, pois interpretaram o Código de Ética como lutar pela harmonia e valorização da classe odontológica.

    Ser corrupto é a pior coisa, mas ser corporativista é o segundo pecado. Você foi nomeada para trabalhar pela Justiça, seu patrão é o Juiz de Direito que o contratou. Seu dever é passar a maior confiança para que ele o nomeie mais outras vezes.

    As ofensas que ouviremos serão horríveis, mas já alerto que isso existe e que ninguém deve ser curvar aos gritos de advogados ou de outros dentistas. Por exemplo, já cheguei a ler de um advogado que disse que eu não havia me formado na USP, e que se tivesse, foi porque comprei a vaga.

    Outro motivo é a inveja com o pagamento pericial. Tenha certeza que o advogado que ofende recebeu muito menos que o perito para trabalhar naquele processo. E também inventam regras: o perito nunca pode receber mais que o advogado. Por isso, conhecer a legislação é importante, muito embora a parte do Código de Processo Civil que trata da prova pericial é curta e simplicada. Veja:

    Art. 464.  A prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação.

    §1º O juiz indeferirá a perícia quando:

    a prova do fato não depender de conhecimento especial de técnico;

    for desnecessária em vista de outras provas produzidas;

    a verificação for impraticável.

    §2º De ofício ou a requerimento das partes, o juiz poderá, em substituição à perícia, determinar a produção de prova técnica simplificada, quando o ponto controvertido for de menor complexidade.

    §3º A prova técnica simplificada consistirá apenas na inquirição de especialista, pelo juiz, sobre ponto controvertido da causa que demande especial conhecimento científico ou técnico.

    §4º Durante a arguição, o especialista, que deverá ter formação acadêmica específica na área objeto de seu depoimento, poderá valer-se de qualquer recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens com o fim de esclarecer os pontos controvertidos da causa.

    Art. 465.  O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo.

    §1º Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de nomeação do perito:

    arguir o impedimento ou a suspeição do perito, se for o caso;

    indicar assistente técnico;

    apresentar quesitos.

    §2º Ciente da nomeação, o perito apresentará em 5 (cinco) dias:

    proposta de honorários;

    currículo, com comprovação de especialização;

    contatos profissionais, em especial o endereço eletrônico, para onde serão dirigidas as intimações pessoais.

    §3º As partes serão intimadas da proposta de honorários para, querendo, manifestar-se no prazo comum de 5 (cinco) dias, após o que o juiz arbitrará o valor, intimando-se as partes para os fins do art. 95.

    §4º O juiz poderá autorizar o pagamento de até cinquenta por cento dos honorários arbitrados a favor do perito no início dos trabalhos, devendo o remanescente ser pago apenas ao final, depois de entregue o laudo e prestados todos os esclarecimentos necessários.

    §5º Quando a perícia for inconclusiva ou deficiente, o juiz poderá reduzir a remuneração inicialmente arbitrada para o trabalho.

    §6º Quando tiver de realizar-se por carta, poder-se-á proceder à nomeação de perito e à indicação de assistentes técnicos no juízo ao qual se requisitar a perícia.

    Art. 466. O perito cumprirá escrupulosamente o encargo que lhe foi cometido, independentemente de termo de compromisso.

    §1º Os assistentes técnicos são de confiança da parte e não estão sujeitos a impedimento ou suspeição.

    §2º O perito deve assegurar aos assistentes das partes o acesso e o acompanhamento das diligências e dos exames que realizar, com prévia comunicação, comprovada nos autos, com antecedência mínima de 5 (cinco) dias.

    Art. 467. O perito pode escusar-se ou ser recusado por impedimento ou suspeição.

    Parágrafo único.  O juiz, ao aceitar a escusa ou ao julgar procedente a impugnação, nomeará novo perito.

    Art. 468.  O perito pode ser substituído quando:

    faltar-lhe conhecimento técnico ou científico;

    sem motivo legítimo, deixar de cumprir o encargo no prazo que lhe foi assinado.

    §1º No caso previsto no inciso II, o juiz comunicará a ocorrência à corporação profissional respectiva, podendo, ainda, impor multa ao perito, fixada tendo em vista o valor da causa e o possível prejuízo decorrente do atraso no processo.

    §2º O perito substituído restituirá, no prazo de 15 (quinze) dias, os valores recebidos pelo trabalho não realizado, sob pena de ficar impedido de atuar como perito judicial pelo prazo de 5 (cinco) anos.

    §3º Não ocorrendo a restituição voluntária de que trata o § 2º, a parte que tiver realizado o adiantamento dos honorários poderá promover execução contra o perito, na forma dos arts. 513 e seguintes deste Código, com fundamento na decisão que determinar a devolução do numerário.

    Art. 469.  As partes poderão apresentar quesitos suplementares durante a diligência, que poderão ser respondidos pelo perito previamente ou na audiência de instrução e julgamento.

    Parágrafo único.  O escrivão dará à parte contrária ciência da juntada dos quesitos aos autos.

    Art. 470.  Incumbe ao juiz:

    indeferir quesitos impertinentes;

    formular os quesitos que entender necessários ao esclarecimento da causa.

    Art. 471.  As partes podem, de comum acordo, escolher o perito, indicando-o mediante requerimento, desde que:

    sejam plenamente capazes;

    a causa possa ser resolvida por autocomposição.

    §1º As partes, ao escolher o perito, já devem indicar os respectivos assistentes técnicos para acompanhar a realização da perícia, que se realizará em data e local previamente anunciados.

    §2º O perito e os assistentes técnicos devem entregar, respectivamente, laudo e pareceres em prazo fixado pelo juiz.

    §3º A perícia consensual substitui, para todos os efeitos, a que seria realizada por perito nomeado pelo juiz.

    Art. 472.  O juiz poderá dispensar prova pericial quando as partes, na inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes.

    Art. 473.  O laudo pericial deverá conter:

    a exposição do objeto da perícia;

    a análise técnica ou científica realizada pelo perito;

    a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;

    resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.

    §1º No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.

    §2º É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.

    §3º Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte, de terceiros ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia.

    Art. 474.  As partes terão ciência da data e do local designados pelo juiz ou indicados pelo perito para ter início a produção da prova.

    Art. 475.  Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito, e a parte, indicar mais de um assistente técnico.

    Art. 476.  Se o perito, por motivo justificado, não puder apresentar o laudo dentro do prazo, o juiz poderá conceder-lhe, por uma vez, prorrogação pela metade do prazo originalmente fixado.

    Art. 477.  O perito protocolará o laudo em juízo, no prazo fixado pelo juiz, pelo menos 20 (vinte) dias antes da audiência de instrução e julgamento.

    §1º As partes serão intimadas para, querendo, manifestar-se sobre o laudo do perito do juízo no prazo comum de 15 (quinze) dias, podendo o assistente técnico de cada uma das partes, em igual prazo, apresentar seu respectivo parecer.

    §2º O perito do juízo tem o dever de, no prazo de 15 (quinze) dias, esclarecer ponto:

    sobre o qual exista divergência ou dúvida de qualquer das partes, do juiz ou do órgão do Ministério Público;

    divergente apresentado no parecer do assistente técnico da parte.

    §3º Se ainda houver necessidade de esclarecimentos, a parte requererá ao juiz que mande intimar o perito ou o assistente técnico a comparecer à audiência de instrução e julgamento, formulando, desde logo, as perguntas, sob forma de quesitos.

    §4º O perito ou o assistente técnico será intimado por meio eletrônico, com pelo menos 10 (dez) dias de antecedência da audiência.

    Art. 478.  Quando o exame tiver por objeto a autenticidade ou a falsidade de documento ou for de natureza médico-legal, o perito será escolhido, de preferência, entre os técnicos dos estabelecimentos oficiais especializados, a cujos diretores o juiz autorizará a remessa dos autos, bem como do material sujeito a exame.

    §1º Nas hipóteses de gratuidade de justiça, os órgãos e as repartições oficiais deverão cumprir a determinação judicial com preferência, no prazo estabelecido.

    §2º A prorrogação do prazo referido no § 1º pode ser requerida motivadamente.

    §3º Quando o exame tiver por objeto a autenticidade da letra e da firma, o perito poderá requisitar, para efeito de comparação, documentos existentes em repartições públicas e, na falta destes, poderá requerer ao juiz que a pessoa a quem se atribuir a autoria do documento lance em folha de papel, por cópia ou sob ditado, dizeres diferentes, para fins de comparação.

    Art. 479.  O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito.

    Art. 480.  O juiz determinará, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida.

    §1º A segunda perícia tem por objeto os mesmos fatos sobre os quais recaiu a primeira e destina-se a corrigir eventual omissão ou inexatidão dos resultados a que esta conduziu.

    §2º A segunda perícia rege-se pelas disposições estabelecidas para a primeira.

    §3º A segunda perícia não substitui a primeira, cabendo ao juiz apreciar o valor de uma e de outra.


                Note que o perdedor, ou iminente perdedor interpretará os artigos acima sempre em seu favor. Não se assuste, portanto.

    O FUTURO DO MERCADO DE INDENIZAÇÕES NA ODONTOLOGIA

    Esta é minha opinião sobre o futuro. Pois imagino que isso acontecerá nos próximos trinta nos. O poder Judiciário mal consegue julgar tudo. Mas pense nos acidentes de trânsito em pessoas que protegem seus carros com seguros particulares e assim faremos uma comparação.

    A seguradora não discute muito sobre culpa, se o culpado bateu atrás ou qualquer coisa que os humanos pensam. Os seguros são uma ciência com centenas de anos, já pensaram em tudo e já viram Titanics afundarem e os números já estavam calculados antes. A seguradora trabalha de outro modo: cálculo atuarial. Já li um pouco sobre como as seguradoras calculam o risco de um bem ser perdido. Os bens podem ser carros, imóveis e vida de pessoas. E outras coisas mais caras: navios, plataformas de petróleo, navios ou até mesmo o risco de uma represa romper, como Brumadinho e Mariana, com as subsidiárias da Vale no Brasil.

    Amadores não tem espaço na alta cúpula das seguradoras internacionais.

    A seguradora tem uma grande reserva de dinheiro e a reserva normalmente é gerenciada por outras seguradoras em conjunto. Vamos supor vinte bilhões de dólares. A maioria das seguradoras teve sede em Londres no passado. Usam essa reserva porque sabem que todas as tragédias não vão acontecer num mesmo momento. É uma poupança, por assim dizer das empresas de seguros. Quando uma grande tragédia ocorre, as empresas avançam sobre essa reserva. Existe uma modalidade chamada resseguros – nas quais as empresas fazem um caixa maior entre elas para acessar em caso de grandes pagamentos.

    No Judiciário brasileiro o processo é lento, vamos contar quatro anos para se receber uma indenização de uma pessoa física (paciente comum) que protocola uma queixa de R$ 20.000,00 contra uma empresa odontológica formado por dois sócios. Muitas etapas poderiam ser abolidas.

    O caminho percorrido pode ser: ingressar com uma ação[2] no Juizado Especial Cível. Essa ação será rejeitada na sentença, pois o juiz decretará que aquele caso precisa de uma perícia técnica (o rito sumário do Juizado não comporta a perícia). Então o processo será extinto. O paciente terá que gastar dinheiro e contratar um advogado para entrar com nova ação idêntica na Justiça Cível (isso porque o ritual ordinário permite a perícia). A ação vai demorar, uma perícia vai demorar e o suponhamos que o paciente vença. Haverá o recurso para a segunda instância e que nunca trará novidades – os desembargadores vão provavelmente confirmar a decisão do juiz singular. Depois, ao autor retornarão à primeira instância. Os dentistas serão intimados a pagar, mas não pagarão. O processo terá que entrar na fase de execução. Essa fase é muito desgastante. Suponhamos que dos R$ 20.000,00 devidos as partes resolvam por acordo de R$ 7.000,00. Os dentistas pagam e o paciente recebe o dinheiro e fica contrariado.

    Agora pense na mesma situação se aquele paciente bateu seu Renault Logan 2015 no Jeep Compass 2024 do dentista. O custo foi  R$ 20.000,00 a ser arcado pelo seguro da Allianz Seguros do dentista. O dentista vai abrir o sinistro pelo aplicativo do seguro por celular. O auditor do seguro vai fazer uma breve avaliação que digamos, levará trinta dias. Se o Logan e o Compass ficarem na oficina, calculamos mais trinta dias. Total será sessenta dias. Alguns dias depois, dentista e paciente rodarão pela cidade sem sequer lembrar do acidente.

    E se transportarmos o raciocínio de uma indenização de Odontologia para uma indenização de acidente de trânsito. Como seria? Obviamente, o dentista teria que pagar um seguro de responsabilidade civil. A seguradora não pensaria em culpa ou inocência do dentista, faria um cálculo (já previamente calculado extensivamente, com estatísticas numerosas). E talvez a seguradora chegasse ao mesmo valor de R$ 20.000,00.

    Talvez a segurado não peça radiografias, prontuário, documentos do dentista, pois aquilo já foi computado no momento da contratação e na estipulação do preço que o dentista. A seguradora não pode recusar e recusar outras vezes o pedido, sob pena de perder o cliente. Então acredito que no futuro, as mediações de indenizações na nossa área sejam transformadas nesse procedimento, sem intervenção do Estado, sem poder Judiciário, com uso de inteligência artificial.

    No entanto, nosso problema no Brasil é cultural, pois o povo é muito litigioso e ainda temos a alternativa da justiça gratuita. Outros elementos de pressão são a advocacia, no qual muitos advogados são predatórios; e temos os palpiteiros – aquelas pessoas ao redor do paciente que estimulam a ingressar com ações. E temos as pessoas com visão distorcida, que acreditam em indenizações milionárias por influência de filmes americanos. Todos se confundem. Os processos indenizatórios são frustrantes para todos. Ninguém ganha. Poucos se concluem com acordos ou composição.

    Então, vejo a profissão de perito judicial na Odontologia como mais próxima de um auditor de seguros no futuro. Por isso, aprenda como funcionam os seguros, compre ações na bolsa de grandes seguradoras, aprende sobre Inteligência Artificial e leia o máximo possível. Indico um livro: A Próxima Onda, que trata de como muitas profissões vão desaparecer no futuro. Quem já conhece o tema, conseguirá se adaptar rápido.

    São as minhas opiniões.

    São Paulo, 1º de abril de 2025

    (assinatura digital)


    [1] Perito com 301 nomeações para perícias cíveis. Mora em São Paulo.

    [2] Grande parte das ações teve um processo fracassado nos conhecidos juizados de pequenas causas.

  • O lado ruim da perícia judicial. Comentários sobre o uso de metáforas no laudo. Entenda o que é jurisprudência e como ela influencia o nosso trabalho.

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito

    André Eduardo Amaral Ribeiro, cirurgião-dentista e que atua como perito judicial[1] desde 2014.


    Asseguro que essas vicissitudes acontecerão conosco, o que mostra que estamos escrevendo um texto marcante, que alguns veem como agressivo.

    1. As grosserias durante a perícia

    Asseguro que enfrentaremos muitos engraçadinhos nas nossas perícias. O que mais ouço são duas: o preço que cobramos e se temos a especialidade que o advogado quer. Quando apresentar o valor de seu trabalho, os advogados costumam apresentar uma tabela de organizações de construção civil, com preços para perícias em obras. Esses preços são menores que mil reais. Aviltante. E depois, ainda querem uma superespecialização em Neurologia. E vão escrever provocações para dizer que não tem conhecimento para a perícia.

    Porém, as agressões por escrito não se comparam com as agressões presenciais. Pessoas na perícia com insinuações. Hoje, não tenho mais esse problema. Uma regra: tente limitar o número de pessoas na perícia, nada de parentes, maridos e filhos. O obrigatório são autor e assistentes técnicos do requerido. Os advogados vão querem participar para encher o saco e se falarmos alguma coisa, eles rebatem com “onde está escrito que o advogado não pode participar?”. Eles sempre tentam confundir os novatos, de modo que percebi que é melhor que eles fiquem dentro da sala e que o perito simplesmente ignore as perguntas deles.

    Eventualmente, o perito terá que levantar a voz e colocar ordem no recinto. Veja: não temos o poder de prender que os juízes têm. Na audiência, o advogado não pode bancar o engraçadinho. Mas nas perícias ele pode ser o palhaço da festa. Geralmente, citam o Código Civil e a Constituição para testar o perito. Perguntarão se o perito é graduado em direito.

    Outros perigos são os boletins de ocorrência na delegacia ou as ações disciplinares no CROSP. Nenhum dos dois vai nos causar danos, mas é preciso saber lidar com eles. Geralmente, algum inconformado que age aconselhado por palpiteiros a fazer coisas erradas.

    Na delegacia, dirão que se sentiram coagidos com as perguntas na perícia e que consideraram aquilo uma violência psicológica. Afinal, estão lá para responder nossas perguntas. No Conselho, dirão que o perito foi antiético ao falar mal do tratamento dele. No entanto, no processo é o único meio que você pode fazer. Nesses casos, sempre peticione ao juiz e informe o BO ou a ação ética. A decisão do juiz pode englobar as reclamações dos perdedores e vai escrever que o perito prestou o serviço de modo correto e exemplar e que aceitou o laudo para tomar aquela decisão.

    O mais difícil será resolver bate-boca entre as partes. Isso é o pior, pois eles podem se agredir. Mas finja que tem autoridade. Na verdade, se o pau quebrar no seu consultório de perícia, o juiz deverá ser informado. Talvez, com prova de áudio, mas muito raramente, a parte pode tomar uma multa judicial. Essas multas têm um poder fantástico, os juízes deveriam usar mais, como nos EUA.

    IMPUGNAÇÕES PÓS-LAUDO

    Outra fase difícil, mas praticamente inútil, é a fase pós-laudo. As partes vencidas ficam repetindo quesitos, mudam para sinônimos para poder apresentá-los novamente. Também fingem que não entenderam, ou que você não tinha conhecimento para escrever aquele laudo, que obviamente está todo errado. Acredito que o treinamento do perito estará completo quando aprender a lidar com as impugnações pós-laudo sem se estressar. Aprenderá que são sempre os mesmos advogados, com as mesmas técnicas de pseudoimpugnação.

    Algumas impugnações podem nos levar a refletir. De qualquer fora, nunca volte atrás por causa de algum pedido da parte. Veja um despacho ordenando o perito a manifestação sobre uma impugnação:

    No caso, nada mudará, mas essa juíza foi muito boa comigo. Portanto vou dar atenção ao caso. Vejam um trecho sem qualquer sentido:

    Veja como a impugnação é superficial, cheia de palavras genéricas. Fala de um contexto normativo e técnico, um suposto vício. Não apresentou nada concreto, como trazer as frases que considerou erradas e escrever como consideraria correta. Obviamente, a literatura científica dá muito trabalho, então vamos falar de modo vago e impreciso. Vamos mandar para o perito.

    • Uso de metáforas no texto pericial

    Um aluno me fez essa pergunta interessante. No raciocínio dele, o juiz era leigo. Então ele queria se referir ao periodonto e compará-lo com a firmeza das paredes de uma casa. Ele usou uma frase curiosa, que não lembro agora, parecia uma frase bíblica. O uso de metáforas já foi estudado no melhor livro de redação jurídica, do Prof. Antônio Gidi[2]:

    O texto jurídico é formal, mas não precisa ser burocrático, mecânico, previsível. Se puder dar vida ao texto com uma figura de linguagem, faça-o: ele ficará agradável e avivará o interesse pelo tema. Mas não abuse: use figuras de linguagem com moderação, bom gosto e sensibilidade. Não dá para fundamentar um argumento jurídico somente por meio de figuras de linguagem.

    Logo, fomos advertidos por um autor que tem autoridade no assunto da escrita jurídica e que defende o conceito britânico de plain language. Na mesma obra:

    A batalha contra o juridiquês não é recente nem privilégio da nossa cultura. Há séculos que os leigos reclamam que a linguagem jurídica é impenetrável. Eles alegam que o jurista fala difícil desnecessariamente, que deveria evitar o jargão e escrever de forma que o público compreendesse. Em inglês, diz-se legalese. Em 1792, Jeremy Bentham não mediu palavras, acusando os advogados de dominar a arte de envenenar a linguagem para cobrar caro dos seus clientes.

    Portanto, estamos advertidos quanto o uso de metáforas em nossos laudos. Sempre haverá uma frase melhor e mais concreta, sem precisar recorrer às metáforas. Pessoalmente, eu não uso.

    • Entenda a jurisprudência.

    Os trechos abaixo são chamados ementas. São o resumo de uma decisão colegiada, normalmente por três juízes, em grau de recurso, o recurso se chama agravo de instrumento. Os agravos são uma forma de recorrer à segunda instância no meio do processo, quando se considera que alguma decisão do juiz singular (de primeiro grau) foi errada. Então, o advogado pode acionar a instância superior para julgar de novo.

    Devemos entender que os juízes que conhecemos no fórum toma decisões sozinhos, são decisões monocráticas. Não existe ainda decisão colegiada no fórum. Os juízes de segundo grau são os desembargadores (juízes promovidos) e decidem sozinhos: decisões monocráticas ou em grupo: decisões colegiadas.

    As câmaras de julgamento ficam no Palácio da Justiça, Praça da Sé, São Paulo. Existem cerca de trinta e cinco câmaras cíveis, e outras tantas criminais e outras especializadas, por exemplo: meio ambiente.

    Quando o recurso chega aos desembargadores, os funcionários montam as pautas para cada uma das reuniões, chamadas sessões de julgamento. É interessante assistir pessoalmente o andamento da sessão. São públicas e o Palácio está aberto para a população. Existe proibição de roupas: shorts ou bermuda para homens. Camiseta regata não pode. Crianças tem certa tolerância quando são pequenos. Portanto, vá de calça e uma camiseta, no mínimo. Não arrume confusão com os funcionários da portaria.

    Suponhamos que existe um pedido de urgência para uma cirurgia ortognática na quarta vara cível da Lapa. O juiz singular de lá negou o provimento do pedido. O advogado recorreu para o Tribunal, como eles chamam. O processo entrara na fila de julgamento. No momento em que for julgado, o relator lê para os outros desembargadores sobre o problema nos autos – o pedido de cirurgia negado e vota. Diz que vai permitir a cirurgia. Ele declara na sala que é a favor da liminar, os outros dois podem seguir o relator ou divergir do relator. Então, numa suposição educativa, um deles segue o relator e outro não segue. Teremos dois votos a um. O terceiro fica chamado de voto vencido. A maioria votou pela liminar, portanto, será cumprida.

    Um funcionário dentro da sala de sessão, com experiência, redigirá essas ementas. Para serem publicadas no Diário Oficial. No entanto, temos que observar os três resumos abaixo e notar a semelhança entre eles:

    AGRAVO DE INSTRUMENTO – ação cominatória –tutela de urgência de natureza antecipada deferida para impor à requerida que custeie a cirurgia ortognática prescrita ao autor – insurgência – não acolhimento – requisitos do art. 300 do NCPC evidenciados – comprovação técnica da necessidade e urgência do procedimento pretendido – é atribuição do médico, não do plano de saúde, indicar o tratamento e os medicamentos necessários ao caso do paciente – doença que acomete a paciente e o seu tratamento não possui exclusão expressa – decisão mantida – Recurso não provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2105347- 22.2022.8.26.0000; Relator (a): Moreira Viegas; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André – 9ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 07/06/2022; Data de Registro: 07/06/2022)

    AGRAVO DE INSTRUMENTO. Plano de Saúde. Decisão que indeferiu pedido de tutela antecipada para que a ré custear e autorizar o procedimento cirúrgico de que necessita o autor. Presentes os requisitos autorizadores da concessão da tutela de urgência nos termos do artigo 300 do CPC. Aplicação das Súmulas 100 e 102 deste Eg. Tribunal e da Súmula 608 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Recurso da que se dá provimento. (TJSP; Agravo de Instrumento 2229719-77.2021.8.26.0000; Relator (a): José RubensQueiroz Gomes; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ribeirão Preto – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 07/04/2022; Data de Registro: 07/04/2022)

    Apelação – Plano de Saúde – Ação de Obrigação de Fazer – Cirurgia de Osteotomia – Recusa de cobertura de prótese customizada – Procedência – Insurgência – Cirurgia prescrita por médico responsável pelo tratamento da paciente – Relatórios médicos confirmam a necessidade da cirurgia – Materiais inerentes ao ato – Junta médica que não pode estabelecer qual o método mais adequado para tratamento da doença – Divergência no tocante aos materiais fica superada pela indicação e justificativa adequadas constantes do Relatório Médico – Entendimento jurisprudencial desta C. Câmara – Sentença mantida – Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1007971-50.2021.8.26.0271; Relator (a): Luiz Antonio Costa.

    Se lermos mil processos do mesmo tema, veremos que existe uma tendência para autorizar as cirurgias, portanto, contra os planos de saúde. Essa tendência é chamada entendimento da Corte. Ao assumir o processo, o advogado sabe disso, que haverá tendência de que o paciente vença e consiga a cirurgia. Entretanto, o perito ao redigir terá que entender isso e escrever de modo que revele a necessidade de cirurgia tanto para o juiz de primeiro grau, como para os juízes de segundo grau. O laudo precisa deixar claro que a cirurgia é realmente necessária e citar algumas fontes bibliográficas. Perder uma causa dessas é raro. Então, escreva e fortaleça com dados, por exemplo, escreva: o paciente não tem doenças crônicas e não é tabagista, portanto, pode ser operado imediatamente, depois que os exames de praxe forem realizados. Fale sobre a segurança do paciente: a anamnese foi feita corretamente? O paciente compreendeu os riscos da cirurgia? O paciente assinou o termo de consentimento?

    Vamos supor que o perito sinta que a cirurgia não terá a segurança necessária, então aponte isso e deixe que decidam. A anamnese foi superficial e o paciente não realizou exame prévios e ainda o consideramos ASA-III. Já impedi muitas cirurgias porque percebi que havia algo errado: o paciente foi coagido pelo profissional. O paciente está inseguro, não teve informações suficientes para entender os riscos da cirurgia. Logo, o perito pode ser contrário à cirurgia. Nesse caso, os julgadores acima de nós vão seguir nossa conclusão e até usarão trechos de nosso laudo na sentença de primeiro grau. Confie em mim, isso acontecerá.

    São Paulo, 9 de abril de 2025

    (assinatura digital)

    andreamaralribeiro@hotmail.com


    [1] Nomeado 301 vezes para realizar perícias em Odontologia no Poder Judiciário.

    [2] GIDI, Antônio, Redação Jurídica: estilo profissional, Ed. Podium, Salvador, 2024, p.349.

  • Acontecimentos pouco comuns na prática pericial. Soluções que o perito deve criar. Falta de regra ou legislação é uma boa para podermos criar e inovar na perícia judicial

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito

    André Eduardo Amaral Ribeiro, cirurgião-dentista e perito judicial em São Paulo


    A REGRA NÚMERO UM DO RELACIONAMENTO

    Esqueça que você foi nomeado porque é inteligente ou porque tem muitas especializações ou um currículo invejável, até porque se sente superior. Se o juiz o escolheu, resolva tudo que aparecer. Ele vai agradecer, apenas não pise no calo dele. Ele é o mestre, todo o crédito se deve a ele. Nunca usurpe essa função. Do resto, crie tudo e escreva seu laudo com já fosse a sentença judicial, deixe para a autoridade judiciária apenas arbitrar os valores. Se agir de modo passivo, será substituído por outro mais ousado.

    Nunca ofusque o brilho do mestre, escreveu Robert Greene em seu best-seller As 48 Leis do Poder[1], que começa no primeiro capítulo: Faça sempre com que as pessoas acima de você se sintam confortavelmente superiores. Querendo agradar ou impressionar, não exagera exibindo seus próprios talentos ou poderá conseguir o contrário – inspirar medo e insegurança. Faça com que os mestres pareçam mais brilhantes do que são na realidade e você alcançará o ápice do poder.

    E conta a história de Nicolas Fouquet, ministro das finanças do Rei Luís XIV, que acabou preso numa ilha, pois cometeu o erro de desafiar o rei-sol, ao fazer uma festa e deixar o rei em segundo plano. O mesmo acontece com o perito, nunca deixe o juiz em segundo plano, use palavras diminutivas para se autorreferir como – auxiliar, nomeado. Nunca assuma o pensamento de que está na presidência do processo. No entanto, trazer soluções incomuns e criativas para resolver os problemas do juiz de direito é sempre inteligente: pressão da Corregedoria de Justiça, erros cometidos pelo juiz ou seus subalternos, julgamentos que foram anulados por falta de perícia no primeiro grau (mas por ordem dos desembargadores).

    CONVITE PARA SER PERITO. PROPONHA SOLUÇÕES

    Isso existe e já aconteceu comigo umas dez vezes. Sempre na situação semelhante, cidades pequenas com vara de Justiça única. Na falta de peritos, normalmente eles pedem para a capital do Estado, por telefone, para indicar um perito. Às vezes, e isso aconteceu em Brasília comigo, um advogado sugeriu que o processo era muito complexo e que um perito deveria ser procurado em São Paulo ou Rio de Janeiro. No caso foi no Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Outro caso, pode ser o contato com a Universidade Federal para que indique um professor para resolver o caso pericial. Por incrível que pareça, os professores alegaram que tinham muito trabalho e recusaram a nomeação.

    Os juízes se comunicam entre eles, normalmente aqueles que se conhecem ou que fizeram faculdade juntos e que tomaram rumos diferentes, um virou juiz do trabalho, outro virou juiz federal e outro, juiz estadual. Não importa, eles se conversam para o bem e para o mal. Isso explica quando algum perito comete um erro grosseiro na perícia e, num sopro de vento, ninguém mais o chama para nenhuma perícia.

    Um dia, algum funcionário de uma cidade da qual nunca ouviu falar liga no seu telefone. Por exemplo, no Nordeste eles são práticos. Não intimam ninguém ser ter certeza de que a pessoa vai aceitar o encargo. Conduta que não fazer em São Paulo, que chega a nomear dez peritos nos autos e ninguém aceita. Em destaque, para processos com morte na cadeira do dentista. A estratégia é: pesquisam peritos em cidades maiores, assim o escrivão pode ligar, perguntar se quer ver o processo, perguntar quanto vai cobrar. Normalmente, juiz está na sala ouvindo a conversa para já dizer sua decisão. Se disser que aceita e que vai cobrar R$ 5.000,00; a escrivã pode adiantar que lá na cidade não há como cobrar aquele valor. Confie nela, ajude a resolver o problema deles e será recompensado.

    Por exemplo, no meio da epidemia de COVID, eu não estava recebendo nomeações. O telefone tocou de uma cidade com quarenta mil habitantes, a 300 km da minha casa, mas no Estado de São Paulo. A escrivã me ligou e explicou: eles haviam recebido um pedido de liminar para uma cirurgia da qual não sabiam pronunciar o nome da patologia – ameloblastoma. Expliquei que era comum na Odontologia. Havia uma paciente, sem dinheiro, que não poderia viajar até a Capital, São Paulo. Perguntaram se eu tinha alguma ideia: lógico que eu tive a ideia, disse que iria até lá e que queria R$ 8.000,00. Mas não havia nada aberto na cidade, não conhecia ninguém que pudesse alugar um consultório. Mas me surgiu uma ideia, e se eu pedisse uma UBS e usasse o consultório para examinar a paciente. Foi o que fiz. Entrei no site da Prefeitura da cidade e descobri o nome da dentista responsável pelo atendimento odontológico. Não era tão pequeno, pois havia quinze dentistas na Prefeitura do município. Conversei com a colega e expliquei a situação. Imediatamente, ela me indicou um endereço e disse que o ideal seria que fosse marcada numa segunda-feira. Disse que sim, combinei tudo e peticionei no processo: a perícia será realizada no dia 15 de abril de 20XX, na UBS e coloquei o endereço. Também pedi à juíza que permitisse o pagamento de metade antes da perícia, para cobrir os custos e dada a situação incomum, epidemia de coronavírus.

    Tudo deu certo.

    MOBILIDADE DO PACIENTE, SERVIÇO SOCIAL

    O comum é que o paciente vá até o perito. Mas como fazer quando a pessoa não tem dinheiro e mora muito longe, ainda some-se que a pessoa tem dificuldades de locomoção. A resposta é fácil, ao invés de acionar o dentista da Prefeitura, nós acionaremos o Serviço Social do município. Da mesma forma, iremos buscar no site para encontrar o nome da assistente social responsável, ligaremos para ela, muito educadamente, explicaremos a solução. Nesses casos é importante marcar a perícia num prazo mais distante, digamos sessenta dias a frente.

    Entenda que o transporte do periciado será o mesmo que uma ambulância. Em municípios pequenos, possivelmente existem moradores que precisam fazer hemodiálise ou outros tratamentos para doenças renais, duas ou três vezes por semana. Pode contar que eles existem. A lógica para o periciado será a mesma. Ele irá numa perua da Prefeitura, como se fosse para a hemodiálise, mesmo que viajem por 700 km. Já aconteceu comigo. Então, nunca se esqueça da existência do serviço social. Quem me ensinou isso foi um juiz em Catanduva, SP.

    SOLUÇÃO POR VÍDEO CONFERÊNCIA

    Pense que o paciente já morreu. Isso aconteceu muito durante o COVID, quando autores e dentistas morriam no hospital e ainda um processo corria sem solução. Até mesmo um morto pode ter que pagar uma indenização, já vi ocorrer. Assim, a sentença judicial é chamada de crédito judicial – aquele que foi reconhecido pela justiça numa decisão transitada em julgado[2] – e o credor poderá entrar contra os herdeiros. Vi isso acontecer no Fórum de Nossa Senhora do Ó, pois as famílias se odiavam e o vencedor resolveu cobrar dos herdeiros, dos filhos do rival, que havia morrido rapidamente por COVID.

    Outro caso, o paciente morreu naquilo que a família supõe que seja por causa do tratamento odontológico. No caso, um garoto de onze anos tinha ido a uma consulta de manhã, e na mesma noite teve uma forte crise de asma (da qual a família já sabia) e com distâncias no sertão, levou tempo para ser transportado para um hospital a 34 km de sua casa. Alguém na família resolveu ouvir os palpiteiros de plantão e inventaram uma teoria absurda: a asma foi agravada pelo anestésico do dentista, naquela manhã, mas que gerou um tipo mais grave de broquioconstrição e uma teoria sem qualquer lógica. No caso, ninguém no Ceará queria aceitar a perícia, ainda mais com pagamento da tabela da Justiça Gratuita, na época uns R$ 300,00. Então ligaram para Fortaleza, a escrivã procurou no Google e achou meu nome. Então, aceitei o encargo, mas como não havia vítima para ser ouvida, resolvi ouvir a dentista da UBS por vídeo, com a mãe da suposta vítima também na chamada. Fiz algumas perguntas, pois sabia que não havia qualquer lógica. E ainda a dentista declarou ter usado lidocaína, no qual achei no livro do Malamed[3], um parágrafo sobre a inexistência de alergia à lidocaína com notícias na literatura. Mas para o leitor, eu não estava ali para periciar, estava ali para dar atenção a mãe do garoto, depois deixei ela falar, para desabafar e independente do que dissesse, aquele momento era importante, trazer alguém de São Paulo para ouvir a tragédia do filho dela era mais importante ainda. A perícia teve um efeito terapêutico para uma mãe que sofria. Não significava outra coisa. Não havia nada mais a ser feito, talvez somente um pouco de atenção.

    Escrevi um laudo de oito páginas, basicamente explicando que estavam confundidas  cada coisa, que os livros diziam outras coisas, que aquilo tinha sido uma infeliz coincidência. A função do perito era aquela.

    Por acaso, esta perícia me rendeu outras vinte e duas no Ceará.

    PRESSÃO DA CORREGEDORIA DE JUSTIÇA

    Acima dos juízes, existe a Corregedoria de Justiça, que cobra a produtividade e produz estatísticas comparativas entre comarcas, juízes, câmaras de julgamento. De um modo geral, os corregedores localizam pontos de estrangulamento e varas superlotadas, investigam os motivos e se há muitos preguiçosos por lá.

    Outra situação que me aconteceu duas vezes foi em capitais do Nordeste. Havia muitos processos com indenizações em Odontologia parados, por falta de peritos. E quem me ligou foi uma juíza auxiliar de Corregedoria, explicou-me a situação e me pediu uma sugestão. Sugeri um mutirão de perícias. Reunir todos os processos em um lote, ou seja, vinte e dois processos, para serem resolvidos em seis dias da semana. Ela gostou da ideia, pediu uma semana. Durante essa semana, telefonei e conversei com uma dentista em Maceió que concordou em alugar o consultório para mim e até ajudou nas perícias! Ela gostou tanto, que está tentando a sorte como perita.

    Então, a juíza me ligou depois de uns dias e me deu liberdade para trabalhar do meu modo. No caso, ela já tinha as minhas referências fornecidas pelo seu par na Corregedoria de Justiça de São Paulo. Portanto, nada foi coincidência. Já sabiam do meu trabalho, já haviam buscado informações sobre mim. E no fim, ainda conheci juízes corregedores em São Paulo, que me tratam com grande respeito e me ligam para consultas rápidas verbais, sobre liminares e outros assuntos que não conseguem sequer pronunciar os nomes das peças de OPME.

    O mutirão se realizou em Maceió com sucesso e a ideia foi parar em Brasília. E espero que outros desses venham neste ano de 2025.

    INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

    A boa fama gera serviços que nem imaginamos. Não posso falar muito sobre eles, mas posso dizer que ajudei (sem ganhar em dinheiro), mas ganhar fama e respeito, ajudei os promotores de Justiça do fórum da Barra Funda, famoso em São Paulo por julgamento de crimes famosos, repercussão nacional.

     De qualquer forma, ofereça-se para qualquer serviço, como disse o Navy Seal, Gene Wentz[4], soldado de elite com maior número de medalhas na Guerra do Vietnã. Em seu livro, ele atribuiu a sua fama à sua capacidade a se voluntariar a todos os trabalhos que apareceram durante a guerra.

    CONCLUSÃO: VOLUNTÁRIO

    Devo muito dessas ideias a este livro de Gene Wentz. Na obra, ele contou que se voluntariava para todas as missões: investigou construções que alegavam ser habitadas pelo sobrenatural na selva do Vietnã, reconhecimentos de longos dias no delta do Rio Mekong, no qual nada acontecia. Até mesmo à captura de um coronel do Vietnã do Norte, missão de extremo perigo, que deveria ser cumprida em seis dias, sem dormir. Li esse livro quando tinha uns vinte anos de idade, mas essa flexibilidade desse soldado nunca esqueci. Acho que na perícia, teremos que agir da mesma forma, aceita tudo: perícias que não pagam nada, viajar a outros estados, oferecer ajuda aos juízes corregedores e promotores de Justiça, sem receber dinheiro. A flexibilidade o obriga o criar e oferecer saída, que no fim das contas, até se esquece que é dentista, que está escrevendo laudos. Pense como um soldado de elite e seja voluntário para tudo no mundo pericial.

    São Paulo, 10 de abril de 2025

    (assinatura digital)


    [1] GREENE, Robert, Editora Rocco, São Paulo, 2001.

    [2] Decisão que não pode mais ser alterada por recurso judicial, a chamada coisa julgada.

    [3] MALAMED, Stanley, autor muito famoso por seu livro sobre técnicas anestésicas em Odontologia.

    [4] WENTZ, Gene, Men In Green Faces, um livro sobre as forças especiais na Guerra do Vietnã. Somente em língua inglesa.

  • Sobre os exames de biópsia – O cirurgião assume o risco de promover a biópsia, mas fator externo o impede. Ele deve receber pelo procedimento? A tentativa ou previsão de uma biópsia não realizada deve gerar pagamento?

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito


    André Eduardo Amaral Ribeiro[1], autor.

    A redação de laudos nos dá ideias para escrever sobre casos concretos. Este se tratou de um pedido de ação cautelar – liberação pelo Judiciário – de uma cirurgia ortognática. Uma reoperação após um fixação interna rígida na mandíbula direita da autora. No entanto, houve soltura de parafusos e a reoperação obrigou-se. Este era o foco da ação: a operadora requerida recusou o emprego de uma placa customizada por sugerir uma placa de estoque.

    A autora foi operada e recebeu a customizada. O cirurgião anotou no pedido da cirurgia que pretendia avaliar a lesão por um biópsia excisional. A lesão inicial da patologia parecia ser a osteomielite. Havia a intenção de biópsia, todos sabemos que acidentes acontecem durante a manobra: perda da peça anatômica, impossibilidade por acesso difícil, risco de hemorragia, sacrífio de tecidos vizinho e risco de espalhamento se numa lesão maligna.

    Após a cirurgia, o advogado da operadora percebeu que uma biópsia foi pedida, mas não viu anotações de que tivesse sido feita. Assim, concluiu que o valor da biópsia deveria ser restituído à empresa pelo cirurgião/paciente.

    O que consideramos como biópsia realizada? Entendi que o laudo histológico seria esse critério, mesmo que inconclusivo. Portanto, se houvesse a perda do material e ele não chegasse ao laboratório, a biópsia não seria considerada. Já se a peça chegasse ao laboratório e o laudo histológico fosse inconcluso, deveria ser considerada feita ou completa.

    No interior do laudo, omitindo identificações da pessoas envolvidas:

    A requerida não comprovou gastos com laborátório de análise histológica. É comum enviarmos peças do corpo humano com material insuficiente ou que se autodestrói no líquido de conservação – o tema é controverso, mas natural nas salas de cirurgia. Embora sempre a biópsia seja desejável por segurança. No entanto, a execução prática do procedimento de biópsia pode se mostrar inadequado quando diante da lesão, p.ex: lesão vascular e risco de hemorragia. Deve-se pagar por uma biópsia sem resultado histológico? Decisões judiciais certamente existem sobre o tema. Não houve qualquer biópsia.  A cirurgia de março de 2023 não contou com manobra cirúrgica de biópsia, tampouco qualquer formulário de envio de peça ao exame anatomopatológica. A cirurgia de dezembro de 2023 tampouco contou com manobra cirúrgica de biópsia, nenhum laudo de exame histológico nos autos. Logo, o reembolso sobre a biópsia solicitada não se mostrou lógico. Não houve custos com laboratório de análises em Anatomia Patológica nem exame histológico.

    A hipótese de osteomielite pode ser levantada com um exame de imagem, uma simples radiografia pode nos fazer suspeitar da doença. A biópsia seria a prova padrão-ouro[2], para recolher o tecido ósseo e levá-lo para análise sobre métodos modernos de colorações e ampliações – métodos histológicos.

    No entanto, nem sempre se consegue a biópsia na prática: a peça pode se dissolver durante a remoção. O risco de fratura óssea pode aumentar após a curetagem do osso para obtenção de material. O cirurgião pode desistir da biópsia se sentir que a fratura óssea é iminente. A biópsia pode parecer bem-sucedida, mas o laboratório de Histologia pode responder que o material colhido foi insuficiente para análise. No entanto, não tivemos nenhuma anotação sobre o que teria impedido a biópsia. E ainda existe o risco de a biópsia ser nociva ao paciente, no caso de lesões malignas de espalhamento rápido. De qualquer modo, nada apontou a tentativa de biópsia e nenhum formulário de remessa da peça anatômica ao laboratório, logo sem custos para a requerida.

    A osteomielite é uma patologia crônica comum em ossos gnáticos – a maxila e a mandíbula. O tratamento da doença não é fácil. Na literatura[3]:

    A biópsia é a remoção de um pequeno fragmento de tecido do corpo vivo com a finalidade de diagnóstico por exame microscópico. É frequentemente indicada para confirmar ou fazer um diagnóstico preciso, especialmente no caso de lesões da mucosa, quando um espécime para imunocoloração é também frequentemente solicitado. Indicações para a biópsia incluem: lesões que têm características neoplásicas ou cancerizáveis; ou lesões que estão aumentando; lesões persistentes que são de etiologia incerta; lesões persistentes que fracassam na resposta ao tratamento; confirmação do diagnóstico clínico; lesões que estão causando ao paciente extrema preocupação.

    Outro autor[4]:

    O termo biopsia indica a remoção do tecido de um ser vivo para exame microscópico de diagnóstico. A biopsia é o procedimento mais preciso e exato de diagnóstico de lesões teciduais e deve ser realizada sempre que um diagnóstico definitivo não puder ser obtido com procedimentos menos invasivos. O objetivo primário da biopsia é determinar o diagnóstico com precisão para que o tratamento adequado possa ser oferecido, visto que muitas lesões diferentes apresentam aparências clínica ou radiográfica semelhantes. Na realidade, a biopsia apresenta maior probabilidade de descartar uma doença maligna do que de diagnosticar o câncer, porque a maioria das lesões orais e odontogênicas é benigna. No entanto, o termo biopsia leva muitos pacientes à percepção de que o cirurgião-dentista suspeita de malignidade; assim, discussões que incluam essa palavra devem ser cuidadosamente formuladas para não causarem alarme ou ansiedade desnecessária no paciente. Os quatro principais tipos de biopsia, geralmente realizados na cavidade oral e a seu redor, incluem (1) biopsia por citopatologia; (2) biopsia incisional; (3) biopsia excisional; e (4) biopsia aspirativa.

    O custo da biópsia se resumiria ao pagamento de laboratório de Anatomia Patológica, não na tentativa fracassada de se remover tecidos. Não houve nenhum formulário que indicasse um laudo de análise anatomopatológica. No corpo do laudo:

    A requerida não comprovou gastos com laborátório de análise histológica. É comum enviarmos peças do corpo humano com material insuficiente ou que se autodestrói no líquido de conservação – o tema é controverso, mas natural nas salas de cirurgia. Embora sempre a biópsia seja desejável por segurança. No entanto, a execução prática do procedimento de biópsia pode se mostrar inadequado quando diante da lesão, p.ex: lesão vascular e risco de hemorragia. Deve-se pagar por uma biópsia sem resultado histológico? Decisões judiciais certamente existem sobre o tema.

    Portanto: (…) (d) a perícia não entendeu que o reembolso seja necessário quer para procedimentos cirúrgicos, quer para a biópsia não realizada, diagnóstico da osteomielite possível por exames de imagem; (e) falhas são naturais nos exames anatomopatológicos/histológicos; (f) reembolso seria justo se houvesse laudo anatomopatológico mostrando a insuficiência do osso coletado e o gasto com ele.

    Logo, existe a tentativa de biópsia? Se o cirurgião anotou no prontuário, deve ser pago, mesmo que não se tenha chegado a um exame patológico? E se o laudo histológico for inconcluso?

    Conclui que existe a tentativa de biópsia e que o pagamento deve ser condicionado à existência do laudo histológico – conclusivo ou inconclusivo.

    Custos operacionais da biópsia

    O material usado para a biópsia pode ser muito simples: lâmina de bisturi e frasco com formol para transporte da peça. No entanto, existem métodos complexos por congelamento, como se lê abaixo na literatura[5] especializada:

    Custos da biópsia – A técnica cirúrgica para a ressecção marginal (i. e., segmentar) é bastante simples. Um retalho mucoperiósteo de espessura total deve ser preparado e separado do osso a ser removido. Serras ou brocas cirúrgicas movidas com motor a ar são utilizadas para seccionar o osso nos locais planejados, e, finalmente, remove-se o segmento. Quando se realiza ressecção marginal ou parcial, o profissional deve determinar se o tumor perfurou as lâminas corticais e invadiu os tecidos moles adjacentes, caso em que se torna necessário sacrificar uma camada de tecido mole para erradicar o tumor, e uma dissecação supraperiostal do osso acometido deve ser realizada. A reconstrução imediata é mais difícil, pois pode não haver tecido mole suficiente para fazer o fechamento sobre os enxertos ósseos. Se o profissional tiver dúvidas quanto à adequação das margens cirúrgicas de tecido mole ao redor da lesão durante a realização da cirurgia em ambiente hospitalar, as amostras ao longo das margens podem ser removidas e enviadas imediatamente ao patologista para exame histopatológico. Esse processo é realizado em aproximadamente 20 minutos pelo congelamento do tecido em dióxido de carbono ou nitrogênio líquido, seguido do corte e coloração da amostra para exame imediato, que é preciso quando utilizado para a avaliação da adequação das margens cirúrgicas. Entretanto, tal exame é menos preciso quando se investiga o diagnóstico histopatológico da lesão pela primeira vez.

    Não encontrei jurisprudência no Tribunal de Justiça de São Paulo, com as palavras-chave: biópsia, tentantiva, reembolso.

    BINÔMIO NECESSIDADE-OPORTUNIDADE

    Questões sobre cirurgia sempre se iniciam pela busca desse binômio. O que se diagnosticou? A cirurgia é indicada? Seria o termo necessidade. Já a oportunidade seria a avaliação do paciente por meio de anamnese, classificação ASA e segurança da cirurgia.

    Teoricamente, a cirurgia pode ser perigosa hoje dado fatores sistêmica desfavoráveis. Porém, a cirurgia poderá ser segura em um mês, com a melhora daqueles padrões.

    Raramente, vejo um laudo com essas três palavras na conclusão. Basta pensar que a perícia não deve assinar uma cirurgia insegura e não deve assinar um cirurgia não indicada, com fim mercantilsta, o clássico “o médico quer operar”. A má fama veio de histórias de parentes que receberam cirurgias desnecessárias, cirurgias em membros errados (direito ou esquerdo), prescrição de marcapassos desnecessários, fixações internas rígidas que poderiam ser dispensadas.

    Ser claro nos dois últimos parágrafos – a cirurgia deve ou não deve ser autorizada? O juiz precisa ouvir isso. Não gere insegurança. Lembre que depois de escrito, assinado, datado e juntado aos autos, não haverá retorno ou retratação. A responsabilidade é só sua e somos pagos para isso.

    Numa informação do Google e IA colhida hoje:

    O “binômio necessidade-oportunidade cirúrgica” refere-se à avaliação da necessidade do paciente em realizar uma cirurgia, combinada com a oportunidade que a cirurgia oferece para melhorar a qualidade de vida ou mesmo salvar a vida do paciente. É uma avaliação que considera a gravidade da doença, o estado geral de saúde do paciente, e as opções de tratamento disponíveis.

    São Paulo, 11 de maio de 2025.

    (assinatura digital)


    [1] Cirurgião-dentista e perito judicial em São Paulo, com 304 nomeações nas varas cíveis do Brasil.

    [2] Exame ideal, mas nem sempre possível em razão de custos e dificuldades na técnica.

    [3] SCULLY, Oral and Maxillofacial Medicine, 2nd edition. Tradução autorizada. Ed. Elsevier, 2008, p. 21.

    [4] HUPP, Cirurgia Oral e Maxilofacial Contemporânea, Hupp, 7ª edição, Ed. Elsevier, capítulo 22.

    [5] HUPP, Cirurgia Oral e Maxilofacial Contemporânea, Hupp, 7ª edição, Ed. Elsevier, p.147.

  • Avacalhação geral nos pedidos de próteses customizadas em Cirurgia Bucomaxilofacial

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito

    André Eduardo Amaral Ribeiro, perito judicial em Odontologia com 310 nomeações em SP, MG, ES, RJ, GO, PR, AL e DF

    andreamaralribeiro@hotmail.com

    O mapa do tesouro

    Nos meus últimos cinco anos, tenho visto a duplicação dos pedidos de próteses customizadas e a resposta negativa das auditorias individuais ou das juntas médicas. Vou mostrar como eu raciocino quando estou escrevendo um laudo. São regras de ouro. Se está lendo isso, já se considere com o mapa do tesouro na sua mão.

    A cirurgia bucomaxilofacial mediada por planos de saúde continua uma piada. Os cirurgiões querem operar, querem indicar próteses customizadas de R$ 300.000,00; querem o deferimento pela Justiça das decisões liminares para operar imediatamente.

    No entanto, continuam incapazes de preencher os documentos mínimos. Vejo até documentos sem data, seguidos de reclamações de advogados, interposição de agravos e todo tipo de embargo sem nenhuma razão. A postulante sequer junta os documentos mínimos para instruir seu pedido de prótese customizada endereçado à operadora de saúde – leia-se: Amil, NotreDame, Sulamérica, Bradesco, Itaú.

    Vou ensinar como diminuir sua chance de recusa e para apressar a sua cirurgia e abreviar o sofrimento do paciente. A primeira coisa – existem documentos obrigatórios: (a) anamnese; (b) anotação das consultas, (c) exames complementares; (d) relatório médico COM DATA, (e) histórico da doença; (f) termo de consentimento. Ouça o que eu digo, isto será regra em um ano.

    Documentos necessários

    (a) Anamnese: entenda que a Justiça precisa ver a anamnese para mostrar a segurança da cirurgia e mostrar que o paciente e o cirurgião conviveram. Afaste qualquer suspeita de que a cirurgia foi decidida em uma rápida consulta e que já decidimos por uma prótese customizada. Portanto, junte a anamnese. Lembre-se que pacientes ASA-III ou mais devem passar por interconsulta com a especialidade da doença crônica. Não duvide disso. Quanto estou nomeado como perito, ninguém vai para a mesa de cirurgia sem a comprovação de avaliação de um diabetes, por exemplo. Pacientes ASA I ou ASA II podem ir sem maiores investigações. Hipertensos e diabéticos sem complicações aparentes podemos considerar a palavra deles como suficiente para a segurança da cirurgia bucomaxilofacial. É uma regra que eu uso, amparada no livro do Prof. Eduardo Andrade sobre farmacologia.

    Considere a segurança da cirurgia o pedido de exames clássicos para o pós-operatório: hemograma, coagulograma, enzimas hepáticas, função renal (clearence); radiografia de tórax e eletrocardiograma. Um médico não precisa opiniar, mas mostre que os exames foram feitos antes de tentar a sorte num pedido de liminar.

    (b) anotação das consultas: antes da cirurgia, obviamente, o paciente foi avaliado em consultório. Mostre a data, junte uma cópia no pedido de cirurgia. Mostre que cirurgião e paciente conversaram.

    (c) exames complementares: mostre os exames de imagem, a simples juntada de uma tomografia ou de uma simples radiografia panorâmica já abre espaço para uma perícia. Sempre, mas sempre apresente um exame de imagem, de preferência, se não quiser ter problemas comigo ou com o juiz de direito.

    (d) relatório médico: a avacalhação é tanta que o advogado diz que apenas isso é suficiente. Então, duas páginas, com um texto Control C+ Control V, que às vezes vem até com o nome de outra patologia ou de outro paciente ou de paciente de sexo oposto. Esse relatório deve conter os CID e os TUSS. Revise tudo e não esqueça da data. O que mais vejo são formulários reaproveitados de outros documentos prévios, sem qualquer cuidado.

    (e) histórico médico/odontológico: se o paciente não esgotou todas as possibilidades de reabilitação em ambulatório, sua prótese vai ser negada. Eu nunca aceito que o paciente passe de um rebordo reduzido para uma prótese customizada sem antes ter comprovado o fracasso de próteses ou implantes. Isso só pode ser feito se o tratamento odontológico prévio tiver sido tentado e fracassado. Do contrário, não terá sua amada prótese customizada. A maioria das minhas negativas são por isso – quando se tenta pular a fase de próteses totais ou de próteses implantossuportadas direto para uma prótese customizada. Raramente assino.

    (f) termo de consentimento: todo o paciente tem alguma noção dos riscos – hemorragia e parada cardiorrespiratória – qualquer pessoa sabe disso. No entanto, o termo de consentimento do hospital, sobre os riscos anestésicos não é o termo de consentimento do cirurgião bucomaxilofacial. O dentista tem o dever da informação, o paciente tem o direito a receber a informação. Vou relatar alguns pontos que raramente constam num consentimento de cirurgia ortognática: parestesia, alteração da forma do nariz, necessidade de tratamento ortodôntico posterior à cirurgia. A regra de ouro é criar seu próprio termo de consentimento e deixar cinco linhas pautadas em branco no fim do termos. Com isso, anote as respostas para as perguntas dos pacientes, que não constaram no texto pré-formatado.

    Dessa forma, o cirurgião bucomaxilo não errará no seu pedido de prótese customizada.

    Essas regras não estão escritas por aí, mas estão sendo adotadas por lógica na Primeira e Segunda Instância, que não se limitam a dizer SIM ou NÃO para a cirurgia, mas tem pedido ao perito para que avalie tudo. Pessoalmente, dou bastante atenção para a segurança da cirurgia (que continua negligente) e para o consentimento (que sempre foi negligente e que não parece que vai mudar).

    Lembre-se: existirá o auditor individual e o desempatador. Leia a RN 424/2017 da ANS para entender do que estou falando. Mas isso já foi assunto de um capítulo no meu livro Introdução à Perícia Judicial em Odontologia. Ele está à venda na Amazon e no Hotmart por R$44,90. Eu o atualizei em maio de 2025, com dezesseis novas páginas.

    Destaquei também os problemas com o Turismo da Saúde, que só aumentam recentemente.

    São Paulo, 5 de junho de 2025.

    Avacalhação geral nos pedidos de próteses customizadas em Cirurgia Bucomaxilofacial

    #perícias

    #auditorias

    #juntasmedicas

    #odontologia #proteses #customizadas

    André Eduardo Amaral Ribeiro, perito judicial em Odontologia com 310 nomeações em SP, MG, ES, RJ, GO, PR, AL e DF

    andreamaralribeiro@hotmail.com

    O mapa do tesouro

    Nos meus últimos cinco anos, tenho visto a duplicação dos pedidos de próteses customizadas e a resposta negativa das auditorias individuais ou das juntas médicas. Vou mostrar como eu raciocino quando estou escrevendo um laudo. São regras de ouro. Se está lendo isso, já se considere com o mapa do tesouro na sua mão.

    A cirurgia bucomaxilofacial mediada por planos de saúde continua uma piada. Os cirurgiões querem operar, querem indicar próteses customizadas de R$ 300.000,00; querem o deferimento pela Justiça das decisões liminares para operar imediatamente.

    No entanto, continuam incapazes de preencher os documentos mínimos. Vejo até documentos sem data, seguidos de reclamações de advogados, interposição de agravos e todo tipo de embargo sem nenhuma razão. A postulante sequer junta os documentos mínimos para instruir seu pedido de prótese customizada endereçado à operadora de saúde – leia-se: Amil, NotreDame, Sulamérica, Bradesco, Itaú.

    Vou ensinar como diminuir sua chance de recusa e para apressar a sua cirurgia e abreviar o sofrimento do paciente. A primeira coisa – existem documentos obrigatórios: (a) anamnese; (b) anotação das consultas, (c) exames complementares; (d) relatório médico COM DATA, (e) histórico da doença; (f) termo de consentimento. Ouça o que eu digo, isto será regra em um ano.

    Documentos necessários

    (a) Anamnese: entenda que a Justiça precisa ver a anamnese para mostrar a segurança da cirurgia e mostrar que o paciente e o cirurgião conviveram. Afaste qualquer suspeita de que a cirurgia foi decidida em uma rápida consulta e que já decidimos por uma prótese customizada. Portanto, junte a anamnese. Lembre-se que pacientes ASA-III ou mais devem passar por interconsulta com a especialidade da doença crônica. Não duvide disso. Quanto estou nomeado como perito, ninguém vai para a mesa de cirurgia sem a comprovação de avaliação de um diabetes, por exemplo. Pacientes ASA I ou ASA II podem ir sem maiores investigações. Hipertensos e diabéticos sem complicações aparentes podemos considerar a palavra deles como suficiente para a segurança da cirurgia bucomaxilofacial. É uma regra que eu uso, amparada no livro do Prof. Eduardo Andrade sobre farmacologia.

    Considere a segurança da cirurgia o pedido de exames clássicos para o pós-operatório: hemograma, coagulograma, enzimas hepáticas, função renal (clearence); radiografia de tórax e eletrocardiograma. Um médico não precisa opiniar, mas mostre que os exames foram feitos antes de tentar a sorte num pedido de liminar.

    (b) anotação das consultas: antes da cirurgia, obviamente, o paciente foi avaliado em consultório. Mostre a data, junte uma cópia no pedido de cirurgia. Mostre que cirurgião e paciente conversaram.

    (c) exames complementares: mostre os exames de imagem, a simples juntada de uma tomografia ou de uma simples radiografia panorâmica já abre espaço para uma perícia. Sempre, mas sempre apresente um exame de imagem, de preferência, se não quiser ter problemas comigo ou com o juiz de direito.

    (d) relatório médico: a avacalhação é tanta que o advogado diz que apenas isso é suficiente. Então, duas páginas, com um texto Control C+ Control V, que às vezes vem até com o nome de outra patologia ou de outro paciente ou de paciente de sexo oposto. Esse relatório deve conter os CID e os TUSS. Revise tudo e não esqueça da data. O que mais vejo são formulários reaproveitados de outros documentos prévios, sem qualquer cuidado.

    (e) histórico médico/odontológico: se o paciente não esgotou todas as possibilidades de reabilitação em ambulatório, sua prótese vai ser negada. Eu nunca aceito que o paciente passe de um rebordo reduzido para uma prótese customizada sem antes ter comprovado o fracasso de próteses ou implantes. Isso só pode ser feito se o tratamento odontológico prévio tiver sido tentado e fracassado. Do contrário, não terá sua amada prótese customizada. A maioria das minhas negativas são por isso – quando se tenta pular a fase de próteses totais ou de próteses implantossuportadas direto para uma prótese customizada. Raramente assino.

    (f) termo de consentimento: todo o paciente tem alguma noção dos riscos – hemorragia e parada cardiorrespiratória – qualquer pessoa sabe disso. No entanto, o termo de consentimento do hospital, sobre os riscos anestésicos não é o termo de consentimento do cirurgião bucomaxilofacial. O dentista tem o dever da informação, o paciente tem o direito a receber a informação. Vou relatar alguns pontos que raramente constam num consentimento de cirurgia ortognática: parestesia, alteração da forma do nariz, necessidade de tratamento ortodôntico posterior à cirurgia. A regra de ouro é criar seu próprio termo de consentimento e deixar cinco linhas pautadas em branco no fim do termos. Com isso, anote as respostas para as perguntas dos pacientes, que não constaram no texto pré-formatado.

    Dessa forma, o cirurgião bucomaxilo não errará no seu pedido de prótese customizada.

    Essas regras não estão escritas por aí, mas estão sendo adotadas por lógica na Primeira e Segunda Instância, que não se limitam a dizer SIM ou NÃO para a cirurgia, mas tem pedido ao perito para que avalie tudo. Pessoalmente, dou bastante atenção para a segurança da cirurgia (que continua negligente) e para o consentimento (que sempre foi negligente e que não parece que vai mudar).

    Lembre-se: existirá o auditor individual e o desempatador. Leia a RN 424/2017 da ANS para entender do que estou falando. Mas isso já foi assunto de um capítulo no meu livro Introdução à Perícia Judicial em Odontologia. Ele está à venda na Amazon e no Hotmart por R$44,90. Eu o atualizei em maio de 2025, com dezesseis novas páginas.

    Destaquei também os problemas com o Turismo da Saúde, que só aumentam recentemente.

    São Paulo, 5 de junho de 2025.

  • Mentalidade retrógrada e destruição do instinto empreendedor.

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito

    André Eduardo Amaral Ribeiro, dentista em São Paulo

    Recém-formados em Odontologia e concursos públicos

    Se me pedissem uma dica sobre o que fazer, antigamente, diria: tente um concurso público em uma Prefeitura. Preferencialmente, um cargo com vinte horas semanais, quatro ou cinco horas por dia, talvez dois dias de dez horas. Acho uma ótima ideia. Faço algumas considerações.

    Quanto entrei na Prefeitura de São Paulo, há onze anos, foi ótimo. Sem dificuldades para ter meus trinta dias de férias, planejados com antecedência, meu direito ao terço de férias. Vale-alimentação, direito ao Hospital do Servidor Público Municipal na Liberdade (HSPM).

    Porém, existe um perito mental nesse tipo de relação trabalhista: o dentista pode começar a se envolver com questões que matarão qualquer mentalidade empreendedora que você possa a ter. Primeiro, começam as imposições da Saúde Pública, palestras em escola, aulas sobre o tema patrocinadas pela própria prefeitura. Depois, surgirão as questões mais complexas: protestos por maiores salários, reajustes anuais e greves.

    Quanto entrei em 2011, pensei em ficar três anos. O tempo voou e quando percebi, meu pensamento estava se estatizando. Entrei em uma comissão de saúde, entrei em um serviço de HIV, comecei a me preocupar com essas questões e perdi o foco do meu objetivo: montar meu negócio, empreender.

    Naquela época, as redes sociais estavam crescendo, pessoas montado negócios on-line, cursos de marketing digital, tecnologia para todo o lado. E eu ali – descascando batata no porão – como cantam os Paralamas no Melô do Marinheiro. Estava ficando para trás. Só entendi isso quando cedi a alguns colegas da unidade da saúde e resolvi entrar numa greve. Fomos ao Viaduto do Chá, protestar em frente ao gabinete do Prefeito. No fim, convenceram a aderir à greve em 2015. Fiquei em casa três dias seguidos. Fui penalizado com as faltas injustificadas, que meses depois foram anistiadas pela Prefeito. Eu notei a perda de meu foco quando estava respondendo a uma sindicância sobre abandono do plantão em razão da greve.

    Jovens de quinze anos montando seu negócio na internet, estudando para criar um marketplace, atualizando-se e eu ali escrevendo uma defesa e pagando um advogado. Foi quando bastou, sentei-me e refleti sobre meu afastamento da minha ideia original: não havia mais conversado com outros dentistas sobre negócios, não havia lido mais livros, estava prestando outros concursos com salário de R$ 4.000,00.

    Mudei quando percebi que a perícia judicial seria um empreendimento e considerei seriamente investir no assunto e que, no fim, se mostrou mais promissora.

    Tenho amigos que dirigem negócios e aulas preparatórias para cursinhos em Odontologia, mas eles estão empreendendo, criando um negócio, crescendo e pensado no futuro, com coisas modernas que envolvam a tecnologia. O erro é entrar no cargo público e desenvolver uma mentalidade derrotada e o sinal de que isso aconteceu será quando estiver participando de uma comissão ou de uma greve. O insight precisa vir o mais cedo possível, do contrário, enterrará seu lado empresarial.

    Volte a ler sobre negócios – um livro atrás do outro para recuperar sua essência e seu foco. Pessoalmente, leio um livro seguido de outro. Minha única regra é que nunca sejam dois livros do mesmo tema, seguidos. Se acabei um livro sobre mercado financeiro, o outro será sobre teoria dos jogos, o próximo uma biografia.

    Recentemente, comecei a tomar aulas de desenho artístico. Normalmente desenho depois de muitas horas digitando meus laudos. Portanto, uma diversificação mental. Ler e desenhar fazem o cérebro funcionar de modo distinto, não sei explicar melhor que isso. Apenas sei que o cansaço após uma sessão de desenho é diferente do cansaço após um laudo de três ou quatro horas. Ambos cansam a mente, por causa do grau de concentração, porém, são resultados diferentes. Um não afeta o cansaço do outro.

    Caso pericial concreto: direcionamento do tratamento

    Na semana passada peguei um caso que me levantou um novidade. Paciente com dores na face e cefaleia, procurou um dentista após ter descartado a enxaqueca por médica neurologista. Após exames, a médica concluiu que se tratava de DTM e encaminhou para o dentista.

    A filha da paciente se recuperava por lentes de contato dentais em um dentista e indicou para a mãe. A mãe concordou e consultou-se. Após o fracasso do tratamento, ela entrou com pedido de indenização e a perícia ficou ao meu encargo. Estudei o caso, ouvi as partes e a assistente técnica do dentista requerido deixou escapar: ele só cuida de estética, ela deveria saber e procurar um dentista para tratar da DTM. No entanto, o paciente não sabe que aquele dentista trabalha só com estética – a pessoa pensa que o dentista não tem essas distinções. Conclui que apesar de chegar com queixa de cefaleia e com um quadro clássico de DTM, o dentista foi mudando as propostas, empurrou o tratamento de dez facetas estéticas no arco inferior. Após instaladas, as dores da autora continuaram e ela acreditou que estivesse relacionadas também com as facetas.

    Pediu o dinheiro de volta, retornou, até que desistiu. Procurou nova dentista que identificou a falta de dimensão vertical posterior como o provável agravo ou causa da cefaleia. Assumiu o caso e dois meses depois, a autora estava ótima.

    Agora, veremos pela óptica do dentista estético: embora deva ter visto a falta de dimensão vertical, resolveu convencer a paciente a melhorar seus dentes anteriores superiores. Esqueceu-se da dor. Quando a dor se tornou incapacitante, a autora já havia perdido a confiança nele.

    Portanto, existe o direcionamento de tratamento? Quando o tratamento é aquele que interessa ao dentista? Como a Justiça entende o caso?

    Já disse muitas vezes: todos os tratamentos começam com um diagnóstico, de preferência com um CID anotado. Depois, o tratamento deve ser coerente com a queixa e o diagnóstico. Neste caso, assinei pela má-prática. A queixa era cefaleia, o diagnóstico era a disfunção temporomandibular, CID 10: K.07.6.

    Assinei como má-prática. Sem relação entre causa e resultado pretendido.

    São Paulo, 12 de junho de 2025

    (assinatura digital)

  • Odontopediatria: a especialidade com menor número de processos judiciais no Brasil

    Odontopediatria: a especialidade com menor número de processos judiciais no Brasil

    #apolice #responsabilidade #civel #odontologia #periciajudicial #perito #codigodedefesa #consumidor #endodontia #implantes #ortodontia #seguro #profissional #laudopericial #assistenciatecnica #enriquecimento #ilicito

     

    1 de julho de 2025

    #periciajudicial #odontologia #indenizacoes #seguranca

    Por André Eduardo Amaral Ribeiro, cirurgião-dentista e perito judicial na área, trabalha em São Paulo, com 313 nomeações desde 2014.

    Contanto: andreamaralribeiro@hotmail.com

    Em cerca de 310 perícias que realizei e 80 assistências técnicos vi apenas um caso de Odontopediatria. Foi um caso de uma criança autista que a mãe considerou que os dentistas estavam tratando seu filho com descaso.

    Depois de consultar umas seis dentistas em São Paulo – tudo em razão de um primeiro molar decíduo com necessidade de tratamento endodôntico. A criança tinha oito anos e era hipercinética. A criança tinha um plano de saúde, que negou a cirurgia em hospital, alegou que a criança poderia ser tratada em ambulatório. No fim, a Justiça concedeu a liminar, a criança foi tratada em hospital para o tratamento endodôntico.

    A mãe leu na internet algumas besteiras e resolveu processar o dentista hospitalar por “não ter colocado um material não definitivo no canal de seu filho”. A juíza determinou a perícia, eu fui escolhido, a perícia foi feita. Porém, uma informação nova veio na perícia: a criança estava sendo tratada em ambulatório, por uma dentista, sem quaisquer problemas. Naquele consultório, a criança se comportava. Então, a operadora da saúde protestou, a teoria de que o tratamento endodôntico estava errado foi derrubada na perícia – no caso, a pasta III era o inconformismo da mãe. Ela perdeu a ação.

    De toda a minha experiência, foi o único caso de Odontopediatria, as especialidades com maior número de processos são:

    1) Implantodontia: implantes perdidos em poucas semanas, principalmente nos protocolos de Branemark.

    2) Ortodontia: em razão de suposta demora e alongamento intencional de tratamento. Os alinhadores móveis estão entrando no cômputo dessa especialidade. Crescimento das demandas rápido.

    3) Cirurgia Bucomaxilofacial, em razão das negativas das operadoras em custear as cirurigas e seus materiais caros.

    4) Estética: Dentística, facetas.

    5) Endodontia: grande parte por limas fraturadas em canal.

    6) Harmonização facial: em aumento lento, já quase encostando na Endodontia.

    6) Periodontia: bem raro.

    7) Estomatologia: bem raro, mas casos muitos interessantes.

    8) Odontopediatria: um caso em 400, aproximadamente. Vi dois casos em processos os quais estudei, mas não participei como perito nem como assistente técnico.

    A distribuição de feitos cíveis indenizatórios, se classificados, encontrará essa divisão entre as especialidades.

    Portanto, podemos dizer que a Odontopediatria é a especialidade mais segura para o exercício da Odontologia no Brasil atualmente.

  • Ghostworking na Odontologia: seu colaboradorar está procurando emprego durante o expediente?

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    Por André Eduardo Amaral Ribeiro, dentista em São Paulo.

    Dificuldades em conseguir mão de obra na Odontologia

    A entrevista com a pergunta sobre uma possível opção CLT ou PJ deve ser respondida com reservas na Odontologia. Se pensarmos que um consultório precisa do trabalhador especializado e os trabalhadores auxiliares. Os auxiliares são genéricos e podem ser treinados e encontrados entre jovens abaixo de vinte e cinco anos de idade, que morem na cidade. A recepcionista de um consultório dentário pode facilmente encontrar outro emprego e trabalhar numa concessionária de veículos, num hospital, numa loja, qualquer lugar. Portanto, tem mobilidade.

    Já a ASB (auxiliar de saúde bucal), mais conhecida com assistente de dentista, não precisa tampouco de um treinamento muito longo. Ela precisa conhecer a rotina, os nomes dos instrumentos, algumas regras. Nada que alguém jovem não consiga. O problema são os trabalhadores especializados – dentistas. Eles serão a coluna vertebral do seu negócio. E não são fáceis de captar e de adequar aos seus negócios, quer seja uma franquia, quer seja um consultório mais familiar, com dentistas da mesma família ou casados entre si.

    Depois que tive esse insight, lembrei dos meus últimos vinte anos na Odontologia e percebi que o problema era mais antigo e não é exclusivo das clínicas que crescem por franquias.

    Empresas da Odontologia na B3

    Numa pergunta sobre o que eu pensava sobre a empresa OdontoPrev e seu desempenho discreto na B3. Com o ticker ODPV3 e cotação de R$ 11,00 no momento deste texto: junho de 2025. Entendo ser uma empresa estagnada, com um flat no preço das ações. Pessoalmente, não vejo nenhum atrativo na compra e vejo muitas dificuldades na gestão do negócio. No site:

    Opinei que não seria um mercado fácil, o crescimento de uma rede com serviços em Odontologia esbarra na dificuldade de se conseguir mão de obra especializada, os dentistas. Desaconselho investir nessa empresa. Não vejo múltiplos e não vejo sustentabilidade num crescimento de longo prazo por entender que o problema da mão de obra não tem solução.

    Dificuldades com mão de obra

    Com a variedade de formas de empreender, um dentista com até cinco anos de formado provavelmente pensa numa forma de montar seu negócio e com mais atenção do que a sua carreia de dentista, na modalidade que trabalha para outros dentistas (CLT ou empresa terceirizadas).

    Um dono de franquias precisa de dentistas especializados para movimentar sua clínica de franquias e vai entrevistar alguns candidatos. Não é possível esconder que todos eles preferem tocar um negócio próprio, pois a profissão da Odontologia meio que faz com que o recém-formado pense naturalmente em ter seu próprio negócio.

    E tive um exemplo de um amigo. Ele montou uma clínica de alto padrão em São Paulo, para o negócio evoluir, ele precisa cobrir todas as especialidades: estética (Dentística e Prótese), reabilitação (implantes), Ortodontia (tradicional e alinhadores Invisalign ou similares), clínica infantil. E ele me comentou que não conseguia uma funcionária dentista para cumprir uma jornada na clínica dele. Muitas exigências: a dentista precisa aceitar trabalhar como PJ terceirizada, teria que cumprir pelo menos dois dias na clínica dele. Não foram muitas candidatas com esse perfil, mas a escolhida era uma ótima profissional. Tão boa dentista que já pensava em montar seu próprio negócio nos cinco anos seguintes.

    Por regra tácita, todos os dentistas que trabalhassem com ele deveriam fazer Instagram, essa qualidade era apurada durante o processo seletivo. Deveriam expor conteúdos sobre sua especialidade, dentro de certa frequência, diremos: um vídeo educativo a cada semana. Esse hábito levou essa moça a melhorar sua comunicação, receber mensagens de pacientes ou clientes. Suas respostas provavelmente eram rápidas e com bom português, pois tinha facilidade na comunicação.

    Com os meses, o inevitável aconteceu. A dentista começou a gravar vídeos, usando o espaço do consultório desse meu amigo. A preocupação com a imagem pessoal era maior, o que levou a moça a usar roupas mais charmosas, preocupar-se com sua make e com os looks do dia. Até que um dia, concluiu que precisava montar seu negócio, talvez com alguma amiga da faculdade. A primeira notícia foi de que não poderia mais vir duas vezes por semana, pediu a redução de seu a agenda para apenas um dia na semana. A segunda notícia foi de que estava trabalhando em outro endereço, com mais liberdades. E a terceira notícia veio em menos de seis meses – não desejava mais trabalhar (na verdade, prestar serviços lá). Desligou-se, para montar o negócio própria ou empreender. Nada mais lógico hoje, com a facilidade na divulgação dos serviços.

    Esse proprietário se queixou que não conseguia um colaborador para a especialidade de próteses dentárias e facetas estéticas, pois todos estavam ocupados em montar seus próprios negócios. No livro Almanaque de Naval Ravikant, o narrador cita a frase sobre o futuro dos negócios: Minha previsão é que no futuro, tenhamos sete bilhões de empresas, no qual ser traduziria num futuro no qual existiria em uma empresa individual para cada habitante da Terra.

    Portanto, vejo essa dificuldade na mão de obra como o maior impedimento para um crescimento sustentável. O seu funcionário (que é prestador de serviços CNPJ) não tem nenhum motivo para ser fiel à sua clínica dentária. O cotidiano de redes sociais e aplicativos de comunicação o leva a pensar em seu empreendimento. Por isso, não acredito que uma empresa como a OdontoPrev consiga ter um crescimento sustentável, pois a mão de obra especializada (dentistas) dificilmente será mantida lá dentro das clínicas, quer sejam da rede ou franqueadas.

    Resta então a empresa familiar, talvez um casal trabalhando junto e tentando dar conta de todas as especialidades. No entanto, não vejo isso com a possibilidade de alavancagem de mão de obra.

    E minha esposa me deu um exemplo. Ela trabalhou numa multinacional e um dos seus subalternos estava presente apenas com o corpo. O tempo todo, esse subalterno pensava em seu negócio paralelo, algo que ela descobriu depois de um ano: ele administrava um e-commerce. Comprava bugigangas de um fornecedor no centro da cidade de São Paulo e revendia para o Nordeste. Esse rapaz usava o computador e o telefone da empresa para tocar seu negócio, durante o expediente. Pedia para sair diariamente, que descobriram que eram para idas ao Correio e seu envio de pacotes para o Nordeste do Brasil.

    Como alguém vai contratar um funcionário que já deseja montar o seu próprio negócio em breve? Como vencer as redes sociais, que anunciam sem parar modelos de negócio que podem ser iniciados com baixos investimentos? Como combater os milhares de cursos anunciados no Instagram, que vendem cursos de linguagem de programação e formas de renda extra?

    Isso até se aplica aos seus auxiliares. Vi um caso concreto de uma recepcionista que administrava a divulgação de uma cabelereira de sua irmã, usando o celular do seu consultório, o notebook do seu consultório do seu patrão.

    Ghostworking

    Ouvi essa expressão na internet. São considerados funcionários que procuram emprego enquanto trabalham à distância. Estão em horário de trabalho e constantemente visitando sites e contatos em outras empresas (concorrentes ou outros setores). No caso, usando o notebook da empresa atual. A pesquisa dizia que 92% dos profissionais admitiam fazer isso.

    Na Odontologia, dadas as mãos sempre ocupadas, o dentista não pode fazer isso. Mas acredito que muitos estejam usando o local de trabalho para fotografar casos, gravar stories do Instagram e divulgações pessoais semelhantes. No entanto, entendo que isso seja a analogia do ghostworking na Odontologia. O dentista não está procurando novo emprego, mas está montado material para montar seu próprio consultório ou seu negócio digital. O ghostworking deve ser considerado uma falta funcional? Merece uma punição ou é mero fruto da tecnologia?

    A questão do aluguel, PJ ou CLT?

    Ouvi um podcast em que alguém perguntou para um empreendedor famoso se ele abriria uma loja física. Acho que foi o tal Primo Rico, Thiago Nigro. A resposta dele foi esclarecedora: Não, não abriria porque não pagaria aluguel por uma loja que funciona meio período. O apresentador pediu para explicar. Um negócio digital funciona e vende vinte e quatro horas por dia, uma loja física só trabalha no horário comercial. À noite, ela fica fechada, não vende. Eu não pagaria por um espaço que funciona meio período.

    Ele raciocinou de uma forma curiosa, mas muito verdadeira. Pensei nessa afirmação dele por alguns dias. A visão dele era bastante avançada. Se uma loja digital funciona à noite, nos feriados e o ano todo, por que pagar por um espaço que fecha à noite e que não funciona aos domingos? Ele tinha razão na analogia. Então, juntar a dificuldade de conseguir mão de obra com essa questão do aluguel, realmente, expandir seu negócio parece difícil, com altos custos. Por isso, não acredito numa explosão de Odontologia empresarial, leia como clínicas franqueadas. O empresário paga aluguel e usa apenas meio período, segundo o entrevistado do podcast. Ele traz dentistas para trabalharem, mas acaba os treinando a sair de lá para empreender.

    Qual a solução?

    Vi a solução em outro exemplo: o consultório familiar. Nestes casos, os dentistas precisam de vínculos muito fortes para trabalharem juntos. Não basta terem feito faculdade juntos, devem ter alguma dificuldade razoável para se separarem do negócio. Então, marido e mulher, que geralmente se dividem em mulher trabalha na área mais estética: Dentística, Prótese e Ortodontia. Já o homem trabalha na área mais sangrenta: implantes e cirurgias, talvez alguma Periodontia mais cruenta. Essa parece ser uma fórmula que dá certo.

    Muitas vezes, é melhor encaminhar um paciente para um colega externo a ter esse colega trabalhando diariamente com você, presencialmente. O exemplo foi dado acima: a odontopediatra que acabou saindo para montar o seu próprio consultório.

    Entrevistas de emprego

    Como contratar alguém que responde sua visão daqui a cinco anos: quero ter meu próprio negócio, na minha própria loja digital. Se contratá-la, ela vai montar um negócio usando o tempo e o hardware da sua empresa. Por isso, vejo a questão da mão de obra na Odontologia cada vez mais complexa. Em quem acreditar numa entrevista de emprego? Numa dentista que diz que pretende fazer carreira no seu consultório? Claro que ela não pretende isso…ela vai produzir conteúdo durante o expediente, vai divulgar o nome, vai aprender lá dentro para depois pedir demissão e montar o negócio dela. Portanto, o cenário é esse.

    São Paulo, 4 de julho de 2025

    andreamaralribeiro@hotmail.com